Todos concordamos que o Guia Eleitoral não é nenhuma Brastemp. É um programa chato cujo enredo é o desfile de candidatos e candidatas a cargos eletivos, de Presidente da República a deputado estadual, prometendo mundos & fundos ao eleitor, que passa a ser o objeto do desejo, o alvo cobiçado por quem precisa de votos para garantir uma boquinha aqui, ali, acolá. Reclama-se, com justa razão, que o malabarismo de muitos candidatos, face ao pouco tempo para se comunicar com o eleitor, chega a ser ridículo. Tal se deu com Enéias, candidato a Presidente da República em 89, que, do alto dos seus trinta segundos podia dizer apenas o bordão: Meu nome é Enéias!. E, mesmo assim, teve mais votos que o doutor Ulysses Guimarães, o provecto candidato do PMDB velho de guerra.
Seja como for, é o que temos em face das circunstâncias. O Brasil tem uma enormidade de partidos políticos e muitos deles operam como legendas de aluguel, disponíveis para compra e venda em qualquer esquina onde se possa fechar negócio. A Lei poderia ter coibido esse exagero ou absurdo, mas não há interesse concreto em equacionar o problema. Nós, eleitores, telespectadores e ouvintes, fazemos todo o sacrifício de acompanhamento do Guia em nome da necessidade de preservar um valor mais alto a democracia. Bem ou mal, há liberdade de expressão, ou senão disso, certamente a liberdade de exposição. É nesse ponto que nos deparamos com caras & bocas antes não vistas ou que somos confrontados com truques como o do fotoshop, bastante utilizado, sobretudo, pelas mulheres, por óbvia questão de vaidade, mas, também, por uma seleta de homens não menos vaidosos ou ambiciosos.
A rigor, tais abstrações não deveriam sequer ser comentadas porque são exatamente isso superficialidades que não acrescentam ao conteúdo que se deseja, ou à mudança que se exige da parte dos que passarão pelo vestibular das urnas. Repito: ainda assim, é o que temos. E temos que agradecer, porque pior foi na vigência dos anos de chumbo do regime civil-militar imposto em 64, em que o sortilégio de uma denominada Lei Falcão representava uma estultice, uma desfaçatez para com o cidadão comum, que paga impostos e ainda tem que suportar o voto obrigatório no Brasil. Lembro uma das campanhas, em que o sinal de TV transmitia o horário eleitoral de Pernambuco. E um candidato a deputado se apresentava da seguinte forma: Trabalhador, perdeu uma perna… Como não dava detalhes, ficava o pastelão no ar. Doloroso era constatar, depois, por meio de informações em outros canais, que o dito cidadão-candidato perdera a perna porque fora torturado nos porões da ditadura, na longa noite das trevas.
Os candidatos, na Paraíba como de resto em todo o Brasil, já começam a prometer. Prometem um Guia Eleitoral propositivo- na repetição de um bla-bla-blá conhecido à exaustão pelo eleitor. Todos sabem que, do segundo diante em diante, é golpe, canelada abaixo da linha da cintura. Este é o nível secretamente reservado para o enredo propositivo que se acena. Guias Eleitorais, como debates políticos, no Brasil, sempre foram acerto de contas entre candidatos, competição para apontar quem tem mais defeitos ou para tentar provar quem é mais santo. Tudo isso é uma empulhação, uma patacoada. Mas, volto ao que disse: é o que temos, na nossa democracia à brasileira, como ironizou o grande jurista Sobral Pinto, de saudosa memória, ao confessar que, de verdade, conhecia apenas o peru à brasileira, que é um prato gastronômico, inegavelmente mais saboroso.
Nonato Guedes