Depois de resistir desde ontem, na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC paulista, à ordem de prisão expedida pelo juiz Sergio Moro por acusação de corrupção e lavagem de dinheiro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, hoje, a decisão de se entregar à Polícia Federal para ser recolhido a uma cela especial montada na Superintendência do órgão em Curitiba. O prazo para a prisão de Lula, condenado a doze anos de detenção, expirou às 17h de ontem, mas o ex-presidente avisou que não se renderia. Todo um teatro político foi montado por Lula e seus seguidores no interior do Sindicato, enquanto do lado de fora grupos de militantes do lulopetismo agitavam bandeiras, cantavam refrões e enalteciam a figura do líder petista.
Representantes de órgãos sindicais e de entidades da sociedade civil, governadores, senadores e deputados, religiosos, estiveram no prédio escolhido por Lula para ser seu bunker, enquanto desafiava ostensivamente a ordem de prisão de Moro, que passou a ser uma sentença do Judiciário. No final da tarde de ontem, surgiu uma preocupação com as condições de saúde do ex-presidente, diante da maratona que ele resolveu pôr em prática como um ato de rebeldia política. A ex-presidente Dilma Rousseff marcou presença, bem como presidenciáveis de outros partidos, como Guilherme Boulos e Manuela DAvila. Na manhã de hoje, foi articulada a celebração de uma missa em memória de dona Marisa Letícia, que foi esposa de Lula e que faleceu quando avolumaram-se as acusações contra ele, depois de várias prisões de expoentes petistas no bojo da Operação Lava Jato.
O ex-presidente partiu para resistir à ordem de prisão invocando o pretexto de que não tivera direito pleno de defesa assegurado. Na prática, a defesa de Lula teve o direito de apresentar recursos consecutivos, que foram denegados, com exceção do habeas-corpus preventivo que lhe foi deferido no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Os argumentos titulados pela defesa de Lula, entretanto, foram considerados inconsistentes. A última esperança do ex-presidente estava concentrada na apresentação de embargos de declaração que supostamente provariam a sua inocência. A perspectiva, contudo, era de derrota. Optou-se, então, por uma atitude política, que foi a resistência na sede do Sindicato, em meio a negociações entre representantes da Polícia Federal e emissários do ex-presidente da República. Com o propósito de respaldar o protesto de Lula, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra desencadeou invasões em vários pontos estratégicos do país, fechando rodovias e infernizando a vida de milhares de pessoas em deslocamento para locais de trabalho ou residências. A missa celebrada hoje foi calculada para um pronunciamento do ex-presidente colocando-se no papel de vítima de uma alegada orquestração das elites do país. Paradoxalmente, Lula sinalizou estar ciente de sua inelegibilidade para concorrer à presidência da República nas eleições deste ano, ao acenar com o apoio a Guilherme Boulos como expressão da esquerda radical na disputa presidencial. Para observadores políticos, a resistência encenada por Lula acabou sendo pífia e melancólica, e contribuiu para isolar o ex-presidente e o Partido dos Trabalhadores no contexto político nacional.
Nonato Guedes, com agências