Numa das medidas mais polêmicas de sua história, a Câmara dos Deputados aprovou, ontem, um polêmico projeto que abre espaço para a irresponsabilidade fiscal de prefeitos, livrando de punição os municípios que ultrapassarem o limite de gastos com pessoal. O texto, que segue para sanção presidencial, é tido por especialistas em economia como um cheque em branco para a gastança ilimitada e uma revogação da Lei de Responsabilidade Fiscal que foi saudada, no seu nascedouro, como um avanço no terreno da austeridade. O projeto altera a LRF para acrescentar que os municípios que tiverem queda de arrecadação de mais de 10% não podem sofrer sanções caso ultrapassem o limite de gastos de 60% da receita com servidores ativos e inativos.
A nova regra só vale se essa redução for provocada por queda de repasses do Fundo de Participação dos Municípios ou royalties e participações especiais. Ou seja, por fatores alheios à qualidade da administração do município. Atualmente, caso ultrapasse o teto e não o restabeleça em até oito meses, a cidade fica impedida de receber transferências voluntárias, obter garantias e contratar operações de crédito até regularizar a situação. Fica proibida ainda de reajustar salários de servidores e de realizar novas contratações. A economista Ana Carla Abrão, ex-secretária da Fazenda de Goiás e sócia da consultoria Oliver Wyman disparou: Esse é o maior atentado já visto à responsabilidade fiscal neste país.
E acrescentou: Significa que não aprendemos nada nos últimos quatro anos de colapso. De acordo com ela, na prática, boa parte dos municípios já não cumpre o limite dos 60%. O que estamos é abrindo mais um buraco na Lei de Responsabilidade Fiscal, já tão desrespeitada ao longo dos seus 18 anos de vigência. Raul Velloso, especialista em contas públicas, observa, por sua vez, que se o projeto for sancionado pelo presidente Michel Temer, pode efetivamente estimular a irresponsabilidade fiscal dos prefeitos. Pondera, entretanto, que em um cenário de queda de arrecadação de impostos por causa da crise econômica recente, a regra da LRF é inexequível, até porque o grande problema dos gastos com pessoal é com os servidores aposentados e não com os ativos.
– Quando a receita desaba, por causa da maior recessão da nossa história, a razão entre pessoal e receita irá subir e ultrapassar os limites. Esse tipo de regra foi feita para épocas de paz, de normalidade acentuou. Ao comentar a aprovação do projeto, o deputado Pedro Paulo, do |DEM-RJ, afirmou que o controle dos gastos com pessoal é o núcleo central da Lei de Responsabilidade. Quando se abre uma exceção para variações de receitas a fim de flexibilizaras punições, estamos abrindo uma porteira para qualquer desculpa de impacto de receita dos municípios com vistas a flexibilizar as sanções, obtemperou. Já o deputado Joaquim Passarinho, do PSD-PA, fez eco: Essa é uma lei dura ,mas é uma lei que conseguiu enquadrar os municípios para não levar para uma quebradeira geral.
Nonato Guedes, com Folhapress