A imprensa e a opinião pública paraibana foram colocadas em prontidão nos últimos dias diante do berreiro do governador Ricardo Coutinho (PSB) de que adversários políticos seus operaram junto ao presidente Michel Temer para não recebê-lo em audiência a fim de tratar do alegado colapso financeiro da Paraíba. No final das contas, descobre-se que a montanha pariu um rato. A controvérsia é grande sobre a negativa formal do Planalto em receber o gestor socialista para discutir pauta administrativa. Os tambores que rufavam dentro do Palácio da Redenção, em João Pessoa, silenciaram. Nada mais se disse nem foi perguntado.
Ao invés do barulho, no bojo dos queixumes sobre retaliação odiosa e ausência de republicanismo, o governador Ricardo Coutinho descobriu uma luz no fim do túnel que o poupa de ir a Temer, em quem, aliás, não reconhece legitimidade desde que ele foi investido efetivamente com o impeachment de Dilma Rousseff, a quem Coutinho apoiou. Por um desses sortilégios da vida e da política, a Paraíba está no rateio de recursos devolvidos ao Tesouro Nacional, ou, mais precisamente, repatriados do exterior, para onde figurões condenados pela Justiça haviam feito remessas ilegais. Isto significa que dinheiro extra cairá automaticamente na conta do Estado, como, de resto, pingará nos cofres de outros Estados.
Há uma divergência sobre cálculos: o governador Ricardo Coutinho tem uma estimativa a mais da quota que lhe cabe nesse “latifúndio” e, ao seu estilo brigão, vai acionar a Justiça para receber centavo por centavo. Seu périplo desloca-se, agora, do Palácio do Planalto para o Supremo Tribunal Federal, onde a presidente Cármen Lúcia poderá atuar como árbitra na contagem dos recursos realmente destinados aos Estados. Diga-se, a bem da verdade, que os referidos ativos financeiros foram desviados do erário por agentes públicos da Era petista e depositados em contas individuais abertas em paraísos fiscais do exterior. Em outras palavras, trata-se de dinheiro roubado do povo que volta às mãos do povo, representado pelo poder público, a quem cabe, por Lei, fixar percentuais das diferentes unidades da Federação e de seus entes satélites, os municípios.
Num país onde a moeda sonante deixou de circular há muito tempo nos bolsos do cidadão comum, a repatriação equivale a um outro dinheiro extra que foi bastante festejado em outra época recente – os royalties derivados da extração do petróleo na camada do pré-sal. Houve polêmica na partilha dos recursos, é claro, como, de resto, qualquer dinheiro desperta apetites e até mesmo “instintos primitivos” de que falava Roberto Jefferson, o delator do mensalão, em outra circunstância. Quando se tentou mediar a distribuição dos royalties entre Estados produtores e Estados não-produtores, instalou-se uma torre de Babel, com discrepâncias acirradas entre representantes políticos desses Estados.
Recordo, muito bem, os bate-bocas travados no plenário do Senado entre dois paraibanos que representavam Estados distintos, tendo como pano de fundo a distribuição dos royalties do petróleo. Vital do Rêgo, senador, eleito pela Paraíba, defendia ardorosamente que Estados como o nosso fossem beneficiados na partilha com um montante apreciável para compensar o processo de esvaziamento econômico-financeiro a que são submetidos. Lindbergh Farias, natural de João Pessoa, mas senador eleito pelo Rio de Janeiro, colocou-se ostensivamente a favor dos interesses da bacia fluminense, alegando que o petróleo fora descoberto lá, é onde se dá o processo de exploração e nada mais plausível que o dinheiro também ficasse todo lá – inclusive porque o Rio, em virtude da incompetência de governos mais recentes, enfrenta uma crise sem precedentes que compromete a quitação de compromissos teoricamente inadiáveis por parte do governo.
O episódio dos royalties foi mencionado por ser ilustrativo na chamada guerra fiscal travada entre Estados, que ninguém conseguiu debelar e que origina conflitos insanáveis, quebrando o mito da Federação como entidade sustentada pelo equilíbrio ou pela equitatividade na partilha de recursos, ainda que levando-se em conta a proporcionalidade populacional, econômica, etc. O royaltie foi o “achado” para tirar do sufoco Estados que se encontravam com a corda no pescoço. Essa repatriação de ativos chega em boa hora para unidades como a Paraíba. Não é o suficiente, porém, para apagar o tom belicoso do governador Ricardo Coutinho em relação a Michel Temer. O gestor paraibano não absorve, de modo algum, o rebaixamento de nota do nosso Estado no ranking nacional conforme critério de análise da secretaria do Tesouro Nacional. Para ele, foi um golpe tão rude quanto a negativa na liberação de recursos constitucionais. Fora daí, é esperar que os ativos da repatriação de divisas cheguem ao nosso território e aliviem o povo paraibano do estágio de dificuldades que tem se especializado em colecionar nos últimos anos, por uma conjunção solar de fatores desagradáveis. Talvez fosse o caso de entoar alvíssaras e evoés pela boa notícia.
Por NONATO GUEDES