O PT foi um partido pedante no seu nascedouro, quando passou a ser saudado como uma experiência revolucionária e atraente por causa da proposta de se converter numa agremiação de trabalhadores, sem patrões. Havia um purismo exacerbado na triagem de quadros interessados em filiar-se à legenda, aqui mesmo na Paraíba, o que gerou vetos a figuras de projeção que tinham interesse em construir aquela experiência e foram inapelavelmente descartadas. São emblemáticos os casos em que o índex petista fulminou líderes conhecidos e respeitados no Estado.
Antônio Mariz, por exemplo, mesmo tendo liderado dissidência dentro do PDS e integrado um grupo renovador que contestava, na Arena, o próprio regime militar, nunca foi bem visto nas fileiras petistas estaduais. Lúcia Braga, que na Câmara adotou posições reformistas, não passou pelo pente fino da cúpula paraibana petista. Marcondes Gadelha foi o caso mais traumático: ele chegou a avançar nos papéis para se credenciar a entrar no Partido dos Trabalhadores e tinha um histórico de membro do grupo autêntico do MDB, que era sintonizado com as lutas de presos políticos e pugnava pela concessão da anistia. Foi rejeitado “in limine” como integrante do PT porque era tido como filho de burguês e também porque nunca fora visto envergando macacão em porta de fábrica.
Em certa medida, o rigor do estatuto original do Partido dos Trabalhadores estimulava esse tipo de sectarismo político ou do que na época foi chamado apropriadamente de “xiitismo”. O PT, quem diria, no nascedouro aspirava a se tornar uma agremiação quimicamente pura, escoimada de vícios que, na sua leitura, contaminavam expoentes dos chamados partidos tradicionais. Jamais os fundadores do PT poderiam adivinhar que a agremiação viesse a naufragar, mais tarde, na esteira de escândalos éticos, envolvendo a apropriação indébita de recursos públicos. Também nunca antes na história do PT os militantes de carteirinha arrebanhados pela ilusão de construir “algo diferente” poderiam prever que os ícones da direção nacional acabassem atrás das grades por terem incorrido em falcatruas antiéticas.
A ortodoxia apregoada pelo PT não resistiu ao contato com o poder. O partido de Lula tornou-se irreconhecível, de tal forma que não só copiou os métodos que condenava em partidos tradicionais como aprimorou-os, elevando o roubo a níveis de profissionalização nunca vistos na história política nacional. Como disse o ministro Ayres de Brito, no julgamento histórico do mensalão, formou-se uma organização criminosa no interior do Partido dos Trabalhadores para saquear o erário com a ascensão do ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva à presidência da República por duas vezes consecutivas. “Companheiros” como José Dirceu e José Genoíno, que eram idolatrados como combatentes na resistência popular, deslumbraram-se no poder, foram com muita sede ao pote, tornaram-se delinquentes. Um fim de enredo melancólico.
O PT busca, agora, ressurgir das cinzas, literalmente. A agremiação perdeu quadros valiosíssimos nos últimos tempos, mas não apenas quadros. Perdeu, também, parcelas de poder, na presidência da República, em governos estaduais, em prefeituras de Capitais e de cidades médias ou pequenas. O ponto de partida do baque experimentado pelo Partido dos Trabalhadores, não por acaso, verificou-se no ABC paulista, em cujas franjas o PT foi modelado e edificado. Hoje, há um mutirão desesperado para pelo menos conter debandada, evitar o esvaziamento total de um partido que se achava em marcha batida para ser um dos maiores, senão o maior, do Ocidente, tal como foi dito por Francelino Pereira em relação à Arena.
A arrogância, o pedantismo do PT não resistiram ao convívio com o poder. E isto faz desmoronar a aura de que a agremiação era diferente, tinha um quê de purismo nas suas entranhas. Recomeçar de novo é a sina que está traçada para o PT, se quiser voltar a dividir espaços no cenário político brasileiro. Mas, evidentemente, nada será como antes. A desmotivação é visível, não houve renovação geracional nos quadros petistas e o líder maior, Luiz Inácio Lula da Silva, vive atormentado com a hipótese plausível de ser preso a qualquer instante. Ao entrar no noticiário policial o PT deixou de ser a referência que aspirava ser. Nivelou-se a outros, inclusive e, sobretudo, na corrupção.
Por NONATO GUEDES