Encontramos “o cara” por quem o presidente americano Barack Obama nutria obsessão: não é o ex-presidente Lula, como imaginamos todos, inclusive, Obama. É Renan Calheiros, senador das Alagoas, presidente do Senado da República, hábil articulador político, “expert” nos meandros do pudê na Capital Federal. Foi o “cara” que ousou desafiar o Supremo Tribunal Federal que, via liminar do ministro Marco Aurélio, decretou o seu afastamento da presidência da Casa. Renan nem assinou a notificação nem se afastou do cargo. Continua mais presidente do que nunca. Ainda ontem foi recebido com alvíssaras e evoés no Planalto pelo presidente da República, Michel Temer. É a suprema glória. O poder absoluto. Viva Renan, viva Alagoas!
Em casos assim é inevitável que prospere uma conjunção de alguns fatores para materializar o fato. Havia brechas claríssimas na liminar expedida de dentro do Supremo Tribunal Federal. O ministro Marco Aurélio foi até especioso e cuidadoso nos detalhes para não incorrer em deslizes nem agravar a crise econômica – expediu a liminar quando as bolsas já estavam fechadas. Mas, quem nunca erra um cálculo? De nada valeu a cautela. O tumulto foi generalizado em Brasília. Afinal, em tese, estávamos diante de um gravíssimo conflito de poderes.
A fragilidade da liminar do ministro Marco Aurélio estava no fato de que se tratou de uma decisão monocrática – portanto, vulnerável e passível de qualquer contestação, como se deu. Ou, pior ainda, passível de desobediência, sem que nada demais aconteça. O resultado é que sobrou mesmo para o Pleno, hoje, um desfecho do imbróglio. O Pleno é um colegiado, portanto, é mais representativo. A insubmissão a alguma decisão dali emanada pode até dar cadeia, se for seguida ao pé da letra a lei. Se bem que no Brasil, a Lei…ora, a Lei… Sobre Renan cabe lembrar que tem antecedentes de denúncias – anos atrás teve que renunciar à presidência do Senado para evitar o pior, que seria a perda de todos os dedos das mãos. Cedeu os anéis, então. Agora, nem isso. Mas Renan é um aproveitador das situações. Intuiu que há um vácuo institucional desde o impeachment de Dilma Rousseff. O campo é fértil para ilegalidades, a despeito do êxito da Lava Jato que premiou em São Paulo, ontem, merecidamente, o juiz Sérgio Moro. Mas no Direito há especificidades que abrem brechas. Renan conhece o jogo muito bem.
Pagou para ver – e está aí, esperando ser aclamado e reclamando que lhe estendam tapete vermelho no Supremo Tribunal Federal. Ou no Palácio do Planalto. Ou onde quiser, ou escolher. Renan pode. Foi a lição que ficou dos episódios de ontem e dos últimos dias também. Tanto pode que no impeachment de Dilma, na frente do presidente do Supremo, na época Lewandowski, propôs a retirada da sanção de inabilitação política por oito anos para a ex-mandatária. E o gesto foi aplaudido. Calheiros é um gênio, não há dúvidas. Parecerista de mão cheia, cabra bom das Alagoas. Quem ousará se indispor com uma figura que conhece o segredo de supersalários da magistratura?
Nos momentos que antecederam a irrupção do golpe militar de 1964 no Brasil era tão imensa e ostensiva a influência do embaixador americano no Brasil, Lincoln Gordon, na preparação da quartelada que derrubou João Goulart, que alguns esquerdistas mais antenados picharam paredes em várias Capitais com uma palavra de ordem emblemática: “Chega de intermediários! Lincoln Gordon para presidente da República”. Foi graças ao empurrão de Gordon e da Operação “Brother Sam” que o general Castelo Branco inaugurou a passarela de militares pelo poder em Brasília. “Mutatis mutandis”, talvez fosse cabível: “Chega de intermediários! Renan Calheiros para presidente!”. É o Brasil, gente!
Por Nonato Guedes