Uma sessão conjunta da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal de Campina Grande, no próximo dia 10, no auditório da Fiep na Rainha da Borborema, homenageará o tribuno e político Raymundo Asfora ao ensejo dos 30 anos de sua morte. Faltando nove dias para a instalação do segundo governo de Tarcísio Burity, do qual Asfora faria parte como vice-governador, a Paraíba foi surpreendida com a notícia de que o corpo do tribuno fora encontrado em sua casa da Granja Uirapuru, nos arredores de Campina Grande, próximo ao açude Bodocongó. Ele estava debruçado sobre a mesa de jantar, com a cabeça apoiada no braço esquerdo, tendo à sua frente uma garrafa de uísque Teacher’s, pela metade, duas carteiras de cigarros, copo, água de coco, uma Bíblia, lápis e papel em branco. A arma encontrada era um revólver Magnum 357. Na têmpora direita havia um orifício bem abaixo do ouvido. Um filete de sangue, coagulado, escorria até o lábio superior, conforme descreveu o jornalista e escritor Severino Ramos em livro.
Asfora tinha 57 anos e ainda hoje há controvérsias sobre a causa da sua morte: suicídio ou assassinato? A tese de homicídio, conforme Severino Ramos, tem prevalecido por conta da posição em que se achava o corpo. Pelo parecer de legistas renomados, a posição do cadáver e testes efetuados com o revólver supostamente utilizado pela vítima, contrariavam provas científicas que demonstram ser impossível atingir a própria cabeça com tiro descendente e permanecer segurando a arma, colocá-la à esquerda e se posicionar como se estivesse cochilando. Esta foi a conclusão a que chegou o perito gaúcho Domingos Torcheto, especializado em balística. A tese foi acolhida e sustentada pelo legista paraibano Genival Veloso de França, que ganhou notoriedade nacional quando da morte de PC Farias e sua amante, Suzana Marcolino, provando que os dois tinham sido simplesmente assassinados, com isto contrariando parecer dos peritos Badan Palhares e Nelson Massini, da Universidade de Campinas, São Paulo.
Natural de Fortaleza, Raymundo Yasbeck Asfora foi residir em Campina Grande, onde se projetou como tribuno e como uma revelação política. Ele se classificava como “descendente de árabes, cearense de nascimento e campinense de coração”. A iniciativa da homenagem em sessão conjunta da AL e Câmara de Campina partiu do deputado Bruno Cunha Lima e do vereador Lula Cabral e os convites já estão sendo expedidos pelas Mesas Diretoras. Na véspera da morte, Raymundo Yasbeck Asfora telefonou para Ronaldo Cunha Lima, então prefeito de Campina Grande e seu “amigo-irmão” de muitos anos, solicitando que ele e sua mulher fossem até a Granja Uirapuru, onde morava. No encontro, pediu que Ronaldo comprasse a granja para a prefeitura e a destinasse à residência oficial do prefeito. Ou que comprasse a casa como pessoa física, um patrimônio de que ele podia dispor nos fins de semana. Raymundo estava profundamente abatido com uma crise doméstica que culminou na separação de sua segunda mulher Gilvanete Vidal de Negreiros. O casamento estava desgastado e havia um acúmulo de dívidas contraídas em nome de Asfora. Ele se sentia desgastado e pedia informações sobre o que diziam, nas ruas, a seu respeito. No bar do Miúra, Asfora escreveu, já de madrugada, o seu último verso: “A vida que tenho tido é uma morte que se adia”.
Raymundo Asfora foi deputado federal e chegou a vice-líder do governo de José Sarney na Câmara dos Deputados. Entre as peças vibrantes do seu repertório como orador, consta a alocução feita na morte do líder camponês João Pedro Teixeira, assassinado em 1962, na rodovia Café do Vento, por pistoleiros contratados por proprietários rurais da Várzea, incomodados com a militância sindical de João Pedro. “É inútil matar camponeses, eles sempre viverão”, afirmou Asfora, no improviso à beira do túmulo de João Pedro. Recordando a campanha de 86 com Asfora ao seu lado, o ex-governador Burity comentou: “Ele foi um gigante no fascínio que exercia sobre as massas e um político que se projetou pela força da oratória. Construtor de frases de grande beleza plástica, não resumia o talento de tribuno ao formalismo das imagens. Dava-lhes a densidade do conteúdo humano e social, enriquecendo o efeito do sentimento com o poder da razão. Não era apenas um arquiteto de sentenças bem feitas. Era também um engenheiro de ideias sedimentadas. Foi um orador que preencheu os espaços com a precisão de um vigoroso defensor das causas populares”.
Nonato Guedes