Quando conseguiu, por mediação do senador Raimundo Lira, do PMDB, ser recebido em audiência pelo presidente Michel Temer em seu gabinete em Brasília, o governador Ricardo Coutinho, do PSB, teria ouvido ligeira insinuação sobre o fato de ter apoiado Dima Rousseff na batalha contra o impeachment desta. O governador respondeu, de bate-pronto, que havia dado apoio à chapa da qual fazia parte o próprio Temer como candidato a vice, numa composição do PT com o PMDB. Temer fez ar de muxoxo e prontificou-se, de imediato, a encaminhar e liberar demandas postas pelo chefe do Executivo paraibano, franqueando o seu gabinete para novas audiências de defesa dos interesses do Estado.
Nas últimas horas, o assunto dominante nos meios políticos e jornalísticos paraibanos foi o anúncio, pelo governador, de que não vai privatizar a Cagepa, estatal de água e abastecimento por considerá-la superavitária. Ele ainda aproveitou o ensejo para alfinetar os prefeitos de João Pessoa e de Campina Grande sobre riscos que estariam correndo diante da política de municipalização dos serviços de água e esgoto que estão pondo em prática. No que diz respeito ao governo Temer, o presidente havia patenteado o seu interesse quanto a medidas de enxugamento como a privatização de estatais, como contrapartida para que o Planalto acionasse um plano de emergência para socorro financeiro aos Estados.
Ricardo, é o que se comenta, proferiu o “Négo” que havia sido proclamado pelo presidente João Pessoa, ao Palácio do Catete, no final da década de 20 e início da década de 30, recusando apoio ao candidato oficial lançado para a sucessão de presidente. Em consequência, Paraíba e Rio Grande do Sul se uniram como porta-estandartes da revolução de 1930, que teve um mártir e um cadáver, o do ex-presidente João Pessoa, assassinado por um adversário político seu no Estado por questiúnculas paroquiais. Vitorioso o movimento sedicioso de 1930, a bandeira da Paraíba passou a ostentar a divisa do “Négo” e a cor vermelha como sinal de sangue e luto pela morte do presidente João Pessoa.
O que se teme em alguns círculos é que em consequência do gesto de ousadia e de rebelião na questão da privatização, o governador tenha colaborado indiretamente para a detonação de hostilidades contra o Estado por parte do governo federal, numa espécie de blitzkrieg para inviabilizar financeiramente a administração de Coutinho. É uma teoria apenas, ou uma especulação. Independente de Ricardo, há aliados numerosos do governo de Michel Temer na própria bancada federal paraibana, na Câmara e no Senado. Seja como for, Ricardo, mais uma vez, confirma seu estilo atípico no Estado. Recentemente, ele acompanhou Temer, em caráter formal, na inspeção à chegada das águas da transposição do rio São Francisco no cariri paraibano. No discurso, exaltou os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff como decisivos na concretização da transposição, perante um Temer visivelmente desconfortável. Anteriormente, o gestor socialista paraibano havia trazido a ex-presidente Dilma para uma audiência pública no Espaço Cultural em que ela teve a oportunidade de desfraldar a bandeira do “golpe” simbolizado no seu afastamento do cargo.
Ricardo demonstra que não se ajoelha diante do governo de Michel Temer. Para os paraibanos, resta rezar para que Temer seja tocado na sua sensibilidade e não parta para retaliações contra um Estado já bastante sacrificado em todos os pontos de vista. Coutinho mantém-se coerente, mas ele mesmo tem consciência de que está apostando alto e arriscando a própria sobrevivência da Paraíba que lhe cabe administrar.
Nonato Guedes