Diz o advogado Francisco Evangelista, em rede social, resumindo o perfil de Josley Batista, da JBS, que delatou o presidente Michel Temer: “Malandro respondendo a sete inquéritos gravou clandestinamente o próprio presidente. Muitos devem estar comemorando a vitória, inclusive o autor da gravação, que fez um acordo com o MP e saiu livre, sem tornozeleira”. Esse enredo faz com que muita gente, já desacreditada de Justiça no Brasil – apesar de tantas prisões efetuadas e tanto dinheiro repatriado aos cofres públicos depois de passear por paraísos fiscais – passe a achar que não é somente o crime. A delação também compensa, de tal sorte que Joesley está “flanando” pelo exterior, em lugar incerto e não sabido, salvo pela Justiça, que o protege, enquanto a crise avança no Brasil e Temer arranca os últimos fios de cabelos que lhe restam.
“O que está pegando?”, como perguntam os jovens de agora. O que está “pegando” é que os irmãos Batista – Joesley e Wesley, alvos de cinco operações da Polícia Federal, que estavam ficando encurralados com a pressão e já tinham certeza de que seriam presos, lançaram mão de um artifício que a lei permite, uma estratégia engenhosa para se livrarem do xilindró: prepararam uma delação secreta. Para tanto, Joesley colocou um gravador no bolso e saiu a ter conversas que, sabia, seriam cabeludas, como narra uma matéria da revista Veja. Falou com Temer e com Aécio Neves. De posse das gravações comprometedoras, os irmãos procuraram a força-tarefa da Lava-Jato, ofereceram a delação e mostraram o que tinham sobre Temer e Aécio. Empolgados, os investigadores fecharam o acordo. Como bons malandros, Joesley e Wesley conseguiram uma saída muito mais elaborada que a de Marcelo Odebrecht. Não cumpriram um único dia de prisão, ganharam o direito de não ficar com tornozeleira eletrônica e ainda faturaram uma bela grana especulando com dólar, sabendo que a notícia da delação iria causar o que causou: a bolsa desabou e o dólar disparou.
“Fui ingênuo”, queixa-se o presidente Michel Temer, arrependido depois de ter caído como um patinho no conto da conversa com Joesley. O presidente, em certa medida, pagou pela sua arrogância e deixou-se embalar pela ilusão de que é um profissional da esperteza. Os políticos mineiros tradicionais costumavam dizer que esperteza, quando é muita, come o dono. Temer nem chegou a ser esperto. E o que fez de grave? Recebeu em palácio figuras que estavam sendo processadas na Justiça, deu intimidade a um empresário malandro que portava um gravador e que conduziu conversas comprometedoras adredemente instruído por procuradores e autoridades policiais federais. O método é correto, defensável? Há controvérsias. Mas é legal e é adotado em países como os Estados Unidos. O presidente Michel Temer, além de cair no conto dos irmãos Batista, colocou a corda no pescoço, estando na iminência de sofrer um impeachment por crime de responsabilidade e por acolher revelações de empresários que sabidamente têm folha corrida na polícia, ao invés de tomar providências para mandar prendê-los diante do que relataram sobre práticas ilícitas que estavam pondo em prática.
Temer foi de um primarismo sem limites, agravado pelo fato de que, tendo tido passagem pelos meandros da Justiça como promotor, deveria estar precavido quanto a pessoas que o procuram altas horas da noite a pretexto de transmitir denúncias, mas, na verdade, interessados em mercadejar facilidades, como as que Joesley usufrui, longe do Brasil, de onde assiste o circo pegar fogo. Todo esse cenário chegou onde chegou porque havia campo fértil para que assim prosperassem as coisas. O senhor Michel Temer perdeu condições éticas e morais para governar o país – mas não é o caso de estar erguendo bandeirinhas pedindo a volta de Dilma ou de Lula, porque estes não estão menos encrencados. O que cumpre é salvar a democracia, evitando que o desalento ceda a tentações autoritárias ou a imprecações de misticismo que só fazem conduzir o país para baixo. No Brasil, em se plantando tudo dá. A velha esperteza está aí, de volta, premiadíssima como nunca, sendo que é apanágio de uns poucos, não de muitos. É orar pelo País, não há mais o que fazer.
Por Nonato Guedes