Durante apresentação que fez na tarde do domingo na avenida Paulista, em São Paulo, a cantora paraibana Elba Ramalho fez um apelo para o equilíbrio entre artistas sertanejos e forrozeiros – que se constituem em atrações nas festas juninas, principalmente na região do Nordeste. A manifestação de Elba foi um prolongamento de intervenções que ela tem feito, em shows ou através da mídia e das redes sociais, criticando a ameaça de invasão dos festejos juninos, tradicionais em grande parte do Nordeste, por artistas expoentes da chamada música sertaneja universitária, como Marília Mendonça.
Em termos locais, a polêmica foi aberta por Elba Ramalho a propósito da programação do São João deste ano da cidade de Campina Grande, que pela primeira vez é feita com base em parceria pública-privada e na qual foi incluída uma apresentação da própria artista, natural de Conceição, no Vale do Piancó. Elba comparou que está havendo um processo desigual, alegando que cantores do forró não conseguem espaço, por exemplo, na programação de festas como a do peão em Barretos, São Paulo. O senador Cássio Cunha Lima, do PSDB, que foi prefeito de Campina Grande por duas vezes e que é parente do atual prefeito Romero Rodrigues, salientou que as ponderações de Elba devem ser respeitadas e levadas em consideração para um aprofundamento da discussão dos estilos musicais, mas frisou que não considera ter havido descaracterização dos festejos na Rainha da Borborema.
Além da cantora, artistas como Alcymar Monteiro também verberaram contra o suposto processo de invasão cultural no estilo de eventos musicais e consideraram-se marginalizados em função da ofensiva que teria sido desencadeada. Embora tenha diversificado seu estilo ao longo da trajetória, a essência do perfil de Elba Ramalho é centrado na difusão do forró e do baião, inspirada no que é tido como o Mestre de toda uma geração de artistas nordestinos – Luiz Gonzaga, que era chamado “o rei do baião” e que foi incansável na propagação das tradições regionais. A polêmica ganhou vulto agora, como admite matéria da revista “Veja” online por causa da entrada em cena de Elba Ramalho, que é reverenciada pela sua carreira, forjada em muito esforço pessoal e dedicação. Antes de ir tentar a sorte no Rio de Janeiro, Elba Ramalho passou uma temporada em Campina Grande, onde atuou, também, como atriz. Ela se define como legítima representante das tradições do São João e da música nordestina, tendo ficado célebre a sua participação no espetáculo “O Grande Encontro”, reunindo, ainda, Zé Ramalho, Alceu Valença e Geraldo Azevedo. A nova versão do “Grande Encontro”, que tem percorrido capitais do sul do país, não conta este ano com a presença de Zé Ramalho, mas a receptividade tem sido imensa, tal como se deu nas primeiras apresentações.
Elba é uma artista que se impõe pela independência de posições e que se coloca acima da crítica. Ele desafiou os críticos, por exemplo, ao sustentar posição de restrição ao projeto de transposição das águas do rio São Francisco. Elba disse recear que o projeto fosse afetar a preservação do meio ambiente e a política de assoreamento de reservatórios. Mesmo com o intenso bombardeio contra ele – não faltou quem a chamasse de “desinformada” – a cantora não recuou dos pontos de vista, deixando claro não ser contra a transposição em si mas alertando para a necessidade de preservação de aspectos essenciais no projeto de interligação de bacias, encarado como “a redenção do Nordeste” por parte de vastos contingentes da população nordestina. Do ponto de vista da carreira, Elba chegou num patamar em que está estável profissionalmente – e num papel de destaque como ícone da geração de artistas reinventores da própria música popular brasileira.
Nonato Guedes, com Veja