A revista “CartaCapital” publica em duas páginas entrevista concedida pelo governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, quando esteve em São Paulo recentemente para uma visita ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Apontado pela revista como uma das principais lideranças do PSB, Ricardo defendeu a necessidade de o Estado voltar a induzir o desenvolvimento nacional e disse que o projeto de transposição de águas do rio São Francisco, deflagrado na gestão Lula, provocou “o mais duro golpe contra o coronelismo e as oligarquias, pois a água sempre foi o principal instrumento de dominação no Nordeste”.
O gestor paraibano propôs como indispensável a união das esquerdas em 2018 para o enfrentamento da ofensiva neoliberal. Disponibilizada em vídeo em www.cartacapital.com.br a entrevista serviu para Ricardo repudiar a condenação do ex-presidente Lula pelo juiz Sergio Moro, reiterando o argumento de que já havia um pré julgamento nesse sentido. Queixa-se da não apresentação de provas capazes de incriminar Lula, prevalecendo, ao final, uma convicção que segundo entende não deveria existir dentro do Estado de Direito. Sobre a união das esquerdas, Coutinho frisou que é essencial para fazer frente ao desmonte do Estado nacional que estaria sendo patrocinado pelo governo de Michel Temer.
Para Ricardo, a chamada reinauguração popular das obras de transposição do rio São Francisco, de que ele participou, foi um ato de justiça para com os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Explica que Lula pagou 16% da obra do São Francisco e Dilma pagou 70%, ou seja, 86% dela estava quitada até abril de 2016. Agora, pagou-se mais 10%. Ao mesmo tempo, conforme o socialista, Lula teve um papel importante ao ter a coragem de fazer a transposição e desfazer acertos seculares que existiam e ainda existem, principalmente dentro do Semiárido nordestino. “Como governador, participei do ato oficial da chegada das águas com Michel Temer mas ressenti da ausência do povo e também da dureza de alguns discursos que ignoravam a história. Essa obra começou com Lula e Dilma”, ponderou.
A respeito de alianças políticas em 2018, o gestor da Paraíba disse ser impossível trilhar um único caminho, alijando possíveis apoiadores nesse processo. “A correlação de forças está muito desigual, então, é preciso conduzir isso com cuidado. Digo isso com relação ao PT e ao PDT de Ciro Gomes. As esquerdas precisam convergir por uma questão de sobrevivência, inteligência e compromisso com este País. O Brasil está à deriva, sem qualquer debate. Infelizmente, a maior parte do Congresso está dedicada à aprovação de reformas para atender interesses econômicos. Ao mesmo tempo, vendeu-se para o povo a ideia de que o País voltaria a crescer com o impeachment de Dilma. O desemprego diminuiria, a corrupção seria debelada. Isso era uma profunda ilusão, um jogo de retórica para se tomar o poder, derrubando as regras do jogo democrático. O Brasil afundou-se ainda mais na crise. O desemprego atinge 14 milhões de trabalhadores”, pontuou.
O Nordeste – Na entrevista, Ricardo Coutinho alertou que o Nordeste foi a região que mais se desenvolveu nos últimos anos, palco de grandes projetos estruturantes que só pararam, agora, no atual governo. “Durante os anos Lula, a “região-problema” passou a trazer soluções. Antes, no segundo mês da seca já havia invasões das feiras e supermercados pela população. Agora, estamos na pior seca do século e não houve qualquer saque, pois se criou uma rede de proteção social. Criou-se, por exemplo, o Programa de Aquisição de Alimentos, que agora está morrendo, estrangulado pelo governo federal. Com a crise, a mudança de visão e de trato político, a região está sofrendo o impacto”.
Ao criticar a aprovação no Senado da reforma trabalhista que altera profundamente a CLT, Coutinho comparou: “A impressão que tenho é a de um grupo de hienas diante de uma presa com certa fragilidade. Aproveita-se e retira-se tudo. É isso que está acontecendo. A falta de crescimento não se dá por causa da legislação trabalhista. Isso é mais um engodo. A economia continua a patinar porque não há capital disponível, uma vez que o Estado se encolheu. Não há nenhuma experiência no mundo, de saída da crise, de uma recessão, sem investimentos públicos”. De acordo com Ricardo, está sendo gestado um país menor, menos competitivo, que não consegue se impor perante outros parceiros mundiais, e isso está sendo feito em função da grave omissão do Congresso.
– Também há essa confusão que paralisa o Brasil e faz com que as atenções da população estejam voltadas para um caso novelesco, ao mesmo tempo que se muda a legislação trabalhista. A questão não era a retomada do crescimento. Na verdade, aproveitou-se de um momento de fragilidade, de falta de organização dos direitos, para a retirada de direitos – expressou o governador paraibano. Indagado sobre qual o motivo de a reforma trabalhista ser mais sensível para o Nordeste, Ricardo analisou: “Há 40 anos, a leitura política do Nordeste revelava oligarquias que controlavam os Estados com profundo viés conservador. Isso foi mudando paulatinamente. O Nordeste, apesar de sua multiplicidade partidária e governamental, tem gerado uma cobrança maior sobre seus representantes. Engana-se quem diz no Nordeste não se sabe votar. Pelo contrário, lá o voto é muito mais qualificado. O nordestino está atento sobre os representantes que traem seus interesses. Ele tem tido mais capacidade de acompanhar. Isso é bom para a democracia”.
Por Nonato Guedes, com “CartaCapital”