Na conversa que manteve em São Paulo. recentemente, com o jornalista paraibano Walter Santos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou escapar que guarda mágoas do senador Cássio Cunha Lima, do PSDB, atual primeiro vice-presidente do Senado, pelo que chamou de postura belicosa do parlamentar tucano em relação ao PT, a menina dos olhos de Lula, não obstante o desgaste nacional da legenda e o seu envolvimento em escândalos. O desabafo confirma que, na política, os líderes se aliam por interesses e conveniências e que no vocabulário deles não há lugar para expressões que reflitam alianças duradouras. “Os políticos são volúveis demais”, traduz uma “raposa” experiente do cenário local, testemunha de afagos e, no reverso da medalha, de rompimentos aparentemente impensáveis, que não raro se dão com lavagem de roupa suja ou com manifestações de desilusão.
Cássio Cunha Lima, mesmo filiado ao PSDB, tentou abrir portas com o PT na Paraíba, tornando Cozete Barbosa sua vice-prefeita em Campina Grande, num gesto que surpreendeu positivamente a cúpula nacional petista e fez Lula reparar melhor no jovem líder que ensaiava seus primeiros passos no ingrato território da política. Cássio fez mais: transferiu a plenitude do cargo a Cozete quando se desincompatibilizou para concorrer ao governo do Estado. No papel de prefeita, Cozete enrolou-se em problemas de gestão que fulminaram sua imagem e abreviaram uma trajetória que ela cogitava que fosse mais duradoura. O arranhão mais grave se deu no “acerto de contas”, ou seja, no duelo travado por ela e Cássio através da imprensa sobre parcela de culpa em atos desastrosos. Independente disso, Cássio ficou com crédito junto ao PT pela ousadia de ter promovido a composição política no segundo maior colégio eleitoral do Estado.
Como governador, Cunha Lima beneficiou-se do governo Lula graças ao saldo médio de que dispunha com sua aproximação de outros interlocutores do PT local, a exemplo do ex-vereador e executivo Júlio Rafael, que foi superintendente do Sebrae, já falecido. Júlio foi o pombo-correio de um encontro entre Lula e Cássio em Brasília marcado pela mais absoluta informalidade e camaradagem. O então presidente tratava o tucano paraibano como “Cassinho” e pôs-se à disposição para colaborar no que fosse possível com sua gestão. Em campanhas eleitorais de Lula na disputa pela presidência, aliados de Cunha Lima chegaram a improvisar comitês suprapartidários no Estado, em que os adeptos de Lula pregavam o voto nele e em Cássio. Ambos foram eleitos nos mesmos períodos – 2002 e 2006, a presidente da República e a governador. O vai e vem da política se incumbiu de afastá-los em definitivo. O maior aliado de Lula, atualmente, na Paraíba, é o governador Ricardo Coutinho, do PSB, que já foi aliado de Cássio em 2010.
No episódio da doença e internação de dona Marisa Letícia, mulher de Lula, que acabou vindo a óbito, Cássio fez chegar a Lula sua solidariedade no momento difícil porque ele passava. Por essa época, Cunha Lima já radicalizara na linguagem contra o Partido dos Trabalhadores, ganhando nessa visibilidade nessa cruzada a partir do Senado, do qual é primeiro vice-presidente. Lula contou a Walter Santos que por quase uma dezena de vezes recusou-se a atender telefonemas de Cunha Lima, ressabiado com os ataques que ele empunhou ao PT e a expoentes da legenda. Na Paraíba, Lula já teve como aliados Cássio, José Maranhão e Ricardo. O governador socialista é o atual “xodó” do ex-presidente, pelas atenções que tem lhe dispensado em ocasiões extremamente dolorosas, como a da condenação que ele sofreu do juiz Sergio Moro. Essa lua de mel entre Lula e Ricardo pode, no entanto, ter prazo de validade, segundo analistas da cena política. O empresário paraibano Manuel Gaudêncio, que sempre agiu com fair-play nos embates políticos, tornou célebre uma espécie de sentença: “política é uma atividade dinâmica”. O axioma resiste ao tempo, como se depreende do desaguisado agora reinante entre Lula e Cássio.
Nonato Guedes