Vai se tornando uma bola de neve a Sena acumulada entre o “clã” Feliciano, com atuação política a partir de Campina Grande, e o governador Ricardo Coutinho tendo como pano de fundo a sucessão ao Executivo paraibano. Ricardo ameaça ficar no cargo até o último dia de mandato, sem concorrer ao Senado, como faria parte da lógica política da conjuntura local, a pretexto de que isto é condição sine-qua-non para que ele possa influir na eleição do seu candidato ao Palácio da Redenção, teoricamente o engenheiro João Azevedo, secretário de Infraestrutura e Recursos Hídricos, que não dá sinais de evoluir politicamente em pesquisas de intenção de voto, o que é compreensível em se tratando de um técnico competentíssimo mas que nunca passou pelo crivo das urnas.
Ao se fixar obstinadamente no nome de Azevedo e ao mesmo tempo acenar com a perspectiva de continuar no Palácio da Redenção até o último dia do segundo mandato que disputou em 2014, Ricardo intercepta qualquer pretensão de poder da médica e vice-governadora Lígia Feliciano, esposa do deputado federal e médico Damião Feliciano, presidente estadual do PDT. Ou seja: Ricardo não abre a guarda para a doutora Lígia ascender à titularidade do governo por oito meses, o que seria viável com a sua renúncia ou desincompatibilização para concorrer a outro mandato, muito menos faz qualquer aceno de apoio na direção de uma candidatura da doutora Lígia ao governo. Intimamente, diga-se a verdade, jamais insinuou preferência pelo nome da sua vice para encabeçar a chapa majoritária do seu esquema em 2018.
Ricardo sabe da expectativa natural da sua vice em ser governadora de uma forma ou de outra, quer ascendendo por via da renúncia dele para concorrer ao Senado, quer arriscando uma candidatura própria, que à primeira vista não tem lastro para decolar, nem mesmo com um virtual apoio de Ricardo. O gestor socialista é bem avaliado junto a setores da sociedade, faz uma administração elogiável se colocada na balança junto com Estados que estão em petição de miséria como o do Rio, mas por algum motivo muito forte nem Ricardo assume candidatura ao Senado nem abraça uma pretensão natural ou legítima da sua companheira de chapa na disputa de 2014. E a presumível capacidade de transferência de votos para outrem volta a ser agitada entre os analistas políticos. Todos sabem que não há maiores afinidades ideológicas entre Coutinho e os Feliciano, mas também não há discrepâncias substanciais que dificultem o relacionamento pessoal e a convivência administrativa. A doutora Lígia é respeitada, inclusive, pela postura elegante e criteriosa com que se porta diante da incerteza. Não se conhece, por outro lado, da parte do seu marido, o deputado Damião, qualquer gesto de bravata por falta de aceno do governador quanto ao apoio a Lígia no papel de candidata.
Numa das poucas vezes em que se manifestou sobre o assunto, quando a opção Lígia parecia estar inevitavelmente em pauta, com muita força, o deputado Damião Feliciano veio a público para dizer que havia a expectativa natural de ascensão da mulher à titularidade, mas deixou claro que a lealdade do “clã” ao governo de Ricardo é para valer e que não há cogitação de alteração na hipótese dele preferir outros nomes para lançar e testar à sua sucessão. Enquanto isso, como não há espaço vazio, o prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PSD) vai se credenciando como favorito no páreo, concorrendo pelas oposições – ou, se isto não for possível (dependendo dos humores do clã Cunha Lima-Rodrigues), concorrendo na faixa de oposição a Ricardo Coutinho. Aliás, por estar à frente da prefeitura da Capital, que é tida como “o tambor” do Estado, Cartaxo aparenta ter mais musculatura eleitoral do que o prefeito de Campina, Romero Rodrigues, que ambiciona a vaga de ungido no âmbito do PSDB.
Esses acontecimentos que estão vindo à tona com muito ímpeto fortalecem o adágio popularizado pelo hoje empresário, ex-deputado e ex-secretário Manuel Alceu Gaudêncio, de que política é uma atividade extremamente dinâmica. E fazem ressurgir, também, um axioma que o ex-secretário de Comunicação e editor literário, além de marqueteiro, Carlos Roberto de Oliveira, apregoava no governo Tarcísio Burity, sobre exoneração de um secretário que não tinha áreas de atrito: “É verdade. Mas também não criou áreas de contato”. Estaria a atual vice-governadora Lígia Feliciano enquadrada nesse figurino? Aparentemente sim, com a ressalva, sempre necessária, de que ela só não avança na autonomia de voo porque não parece motivada a entrar em rota de colisão com o governador que não quer ser candidato. Nada impede, então, que a Sena, continuamente acumulada, torne-se mal equacionada ou não resolvida pelo governador Ricardo Coutinho, com consequências inimagináveis, a dados de hoje. É um quadro cujo desfecho convém aguardar melhor, dentro da melhor técnica de argumento de que pode acontecer tudo, inclusive nada…
Por Nonato Guedes