É de extremo mau gosto a briga travada entre o governador Ricardo Coutinho (PSB) e o prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues, do PSDB, ligado ao senador Cássio Cunha Lima, a propósito do racionamento de água na segunda cidade mais importante do Estado. É de mau gosto porque afeta uma população já sacrificada por políticos e poderes públicos em outras demandas. Em segundo lugar, é de mau gosto porque mexe com um assunto grave, com um tema extremamente grave, que é o racionamento de água.
Não faz tempo, especialistas internacionais prognosticaram que o mundo se engalfinharia numa batalha por água, depois da Guerra do Golfo Pérsico que teve como pano de fundo a posse de preciosas reservas de petróleo. Não precisou demorar muito para que a briga pela água se instalasse, inicialmente entre grandes potências mundiais. Tem sido o assunto em pauta, em virtude da ameaça intermitente de escassez. No Brasil, mesmo, foi necessário avançar no projeto de transposição de águas do rio São Francisco, que remontava ao Império, para que necessidades básicas, urgentes, da população, fossem supridas preventivamente. Têm ocorrido mini-transposições dentro da transposição macro, ou da interligação de bacias como também é denominado o projeto que – justiça se faça – o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tomou a peito.
Em relação ao fim do racionamento de água em Campina Grande, o governo do Estado salienta que recorreu a essa medida depois de aconselhado por técnicos e especialistas na matéria, dando conta de que a fase crítica já foi superada e que é possível manter regularidade dentro do cronograma estabelecido. O prefeito de Campina Grande, todavia, insiste na tecla do volume morto, também mencionando especialistas, como tática para contradizer o pronunciamento governamental. Insinua que a administração da Paraíba comete uma irresponsabilidade e ao mesmo tempo insulta a população mais carente de água nas franjas da Rainha da Borborema. Romero é, presumivelmente, candidato a governador. Ricardo, naturalmente cogitado para o Senado, ameaça ficar no cargo até o último dia de mandato deixando de disputar qualquer mandato e empenhando-se para eleger um técnico, João Azevedo, ao Palácio da Redenção.
A opinião pública acompanha, estarrecida, o choque de versões e informações por parte das autoridades, mas é evidente que a situação é desconfortável para quem está de fora, exatamente porque não há consenso em torno de tema de grave repercussão social, e, com isto, as consequências tornam-se imprevisíveis, mas em princípio extremamente perigosas ou danosas. É preciso deixar claro aos pugilistas dessa contenda – e a outros mais que tomarem partido por A ou B – que a questão da água em Campina Grande virou, a esta altura, um caso de Justiça. No Brasil, critica-se muito a chamada “judicialização” da política, numa referência a decisões que são tomadas pelo Judiciário, como se esse Poder não deliberasse exatamente para suprir as omissões ou lacunas de representantes de poderes que têm, por exemplo, a função de legislar.
Pois nesse caso da briga pela água de Campina Grande é preciso que se diga que é bem-vinda a ação da Justiça, quer do Ministério Público, quer de outras instâncias. O deputado estadual Anísio Maia, do PT, protestou contra a intervenção da Justiça usando exatamente o argumento de judicialização ou de ingerência em questões que pediriam outras competências. O deputado – lamenta-se informar – está na contramão da História. A voz das ruas reclama que a Justiça intervenha diante da irracionalidade de líderes políticos que querem antecipar na marra a campanha eleitoral, já que pela lei não podem fazer isso. O episódio é lamentável e apenas serve para demonstrar o quanto é ínfima a mudança de mentalidade nos meios políticos. Quanto mais a sociedade bate panelas ou faz cobranças, mais os políticos tratam o povo com o descaso.
Que estão esperando os senhores representantes do povo? Que haja uma montanha de votos brancos e nulos na próxima eleição? Pois ela virá. Depois das “ovadas” que estão atingindo alguns presidenciáveis apressadinhos como o prefeito de São Paulo, João Doria, do PSDB, e dos apupos dirigidos no encalço do ex-presidente Luiz Inácio Lula na “caravana” que ele põe a andar pelo Nordeste, virá em grande estilo a resposta do eleitor nas urnas. Quem quiser pagar para ver, fique à vontade. Muitas vezes o Brasil costuma ser tediosamente previsível. Apesar de tudo isso, nem Lula nem as elites que Lula ataca são capazes de vislumbrar o que está acontecendo.
Por Nonato Guedes