A vida ensina, é óbvio. Basta tomar o exemplo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, atualmente às voltas com uma peregrinação pelo Nordeste, que denominou de “caravana” e que, na prática, configura uma campanha eleitoral antecipada para as eleições de 2018, por cima dos prazos e dos óbices legais porventura existentes. (Para Lula, transgredir as leis sempre foi normal. Não é à toa que no episódio do seu depoimento ao juiz Sérgio Moro teve que ser levado em caráter de coerção, já que se considera acima da Lei). A “caravana”, sejamos honestos, não tem sido um “sucesso de público” – há registros de que em algumas localidades o quórum é tão inexpressivo que dá a impressão de estar o ex-presidente cometendo um fiasco.
O problema é que Lula já não encanta mais como novidade. E ocorre, também, que a história do metalúrgico que saiu do Nordeste em pau de arara para o Sul e tornou-se vitorioso a ponto de ascender à presidência da República não comove mais como antes. O enredo, inclusive, diga-se a verdade, acabou sofrendo mutações que tornaram irreconhecível o perfil de Luiz Inácio Lula da Silva. A referência, neste caso, é ao desmonte autofágico do PT que se espraia Brasil afora e ao melancólico descenso de Lula em sua trajetória tantas vezes decantada, sobretudo, na primeira pessoa. Lula chegou com a ficha de operário mas com o tempo foi se afigurando um político profissional. E, quando lhe convém, um político pragmático. Desnecessário dizer que Lula nunca agiu por motivação ideológica e sempre detestou rótulos que o empurrassem para uma definição nesse campo.
O pragmatismo político de Lula pode ser visto a olho nu em cenas como as de Alagoas onde ele se confraternizou com Renan Calheiros, um dos políticos de pior extração ética do Brasil, um oportunista que esteve com Collor, esteve com Dilma e se afastou de Temer talvez porque não tenha encontrado o espaço privilegiado que tanto buscou. Renan tem, igualmente, uma folha corrida, uma ficha que se assemelha a um prontuário policial, inquinado que está em inúmeras citações, em diferentes processos, todos envolvendo irregularidades e envolvimento em escândalos. Em certa medida, tomando por base o parâmetro ético-moral que o PT passou a cultivar para valer, com mensalões e petrolões, até que Renan não é estranho no ninho. E é imperioso lembrar que foi por artes de demagogia de Calheiros que se tentou enxertar na Constituição uma “emenda” outorgando espécie de anistia política para Dilma Rousseff quando do seu julgamento no Congresso que resultou no impeachment. Calheiros queria emendar o texto legal para retirar o dispositivo aplicando oito anos de inelegibilidade política que atingiria a ex-presidente, tal como se deu com Fernando Collor de Mello em 1992. Desta feita, o argumento de Renan foi o de que Dilma já havia sido punida o bastante com sua destituição do cargo. Collor protestou, é óbvio. Afinal, a “emenda Renan” corroboraria o odioso “dois pesos e duas medidas”.
Seja como for, o fato de Lula incensar Renan como “grande companheiro” nestas caravanas que cheiram a ostracismo político é emblemático de uma postura recorrente na conjuntura brasileira e que independe de siglas ou de profissões de fé: a do pragmatismo político. Muitos “crimes” têm sido cometidos em nome de uma atitude de incoerência ou de contradição absurda por variados protagonistas ao longo dos tempos. Políticos que se “matam” em campanhas dão-se as mãos em outras empreitadas. Da mesma forma, quem está aliado rompe laços abruptamente, sem dar maior satisfação ao eleitor ou à opinião pública. Aqui na Paraíba temos exemplos aos montes, um dos mais ilustrativos dos quais é o que envolve o governador Ricardo Coutinho e o senador Cássio Cunha Lima. Ambos se juntaram para derrotar José Maranhão. Agora estão rompidos – e tanto Ricardo quanto Cássio cortejam Maranhão, espécie de fiel da balança na intrincada correlação de forças paraibanas.
Quanto a Lula, é doloroso afirmar – mas inevitável: é cada vez menos um mito e cada vez mais um político carreirista, pragmático, um genérico de Renan Calheiros, para quem o que importa é o poder. Os militares da linha dura ficaram conhecidos quando mandaram “às favas” todos os escrúpulos e subscreveram o Ato Institucional Número 5, que simbolizou o fechamento do regime instaurado em 64, o golpe dentro do golpe como foi tratado por colunistas políticos. Lula tem cada vez menos escrúpulos – talvez os tenha mandado às favas. E a sua biografia tão decantada é um retrato na parede, que talvez nem remorsos lhe provoque, a julgar pelas atitudes que emanam do ex-presidente. Uma pena!
Por Nonato Guedes