Os depoimentos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao juiz Sergio Moro, em Curitiba, como parte de processos instaurados contra o líder petista, tornaram-se uma espécie de circo e ofereceram ao ex-metalúrgico o palanque antecipado para a campanha de 2018, ainda que não haja confirmação de que legalmente ele possa disputar o Planalto mais uma vez. Nos interrogatórios, Lula não responde a nada, é sempre inocente, vítima de perseguição odiosa e jamais foi bafejado por um níquel de empreiteiras como a Odebrecht ou a OAS.
Da sala em que cumpre o ritual dos depoimentos, o ex-presidente abala-se para o hotel para uma sesta rápida e, energizado, segue para a via pública onde o palanque já está montado e adornado com a presença de militantes procedentes de diferentes regiões do país, pressurosos por aplaudir o seu ídolo e caricaturar expoentes do Ministério Público e da Justiça, que são tidos como algozes do “intocável”. Lula já está ficando acostumado – na verdade, mal acostumado com esse script, que lhe fornece mordomias, visibilidade na mídia e o indefectível charanga para abrigar o frêmito das torcidas, como nos espetáculos de futebol (ele que é torcedor fanático de time paulista).
Lula dispõe de regalias como nunca se concedeu a um ex-presidente da República, inclusive, a prerrogativa de dizer que está sendo perseguido quando, no contraponto, realiza uma caravana por Estados do Nordeste, escoltado por policiais militares de governadores amigos e desafiando o calendário por fazer campanha eleitoral antecipada, o que não está nos prognósticos da Lei. Haverá quem pergunte: e a condenação de nove anos e seis meses imputada pelo juiz Sergio Moro? Então! A condenação parece ter sido meramente simbólica, no sentido de pôr algum tipo de freio a Lula, já que no tocante à liberdade de ir e vir, ele não está privado absolutamente. Adquiriu mais uma regalia, mediante a tolerância para conciliábulos em lugares secretos com remanescentes da “companheirada”, com os quais mata o ócio planejando alternativas para quando voltarem ao poder e desalojarem a “corja” temerista que ascendeu com o impeachment de Dilma Rousseff.
A contradição entre a “vitimologia” que Lula encena e a liberdade prática que ele usufrui é que tem reduzido o interesse da imprensa internacional pela cobertura da situação política interna brasileira. A tese do golpe, brandida em foros externos, já não sensibiliza nem resiste a evidências. A presidente “impichada”, Dilma Rousseff, pode ser legalmente candidata em 2018 a qualquer cargo que escolher, desde que tenha votos no bestunto para se eleger. Somente o ex-presidente Luiz Inácio da Silva, que se julga “o cara”, tem uma zona de sombra em torno das suas possibilidades de candidatar-se ao Planalto novamente, porque a elegibilidade vai depender da natureza dos inquéritos instaurados contra ele. Essa batalha judicial era previsível, sempre esteve na lógica dos acontecimentos. Lula, malandramente, é que tentou inverter os fatos e aprontar cenários surrealistas.
Passa bem o ex-presidente da República. É um “marajá”, comparado a ex-companheiros que dormem em celas malcheirosas e não sabem como será o dia de amanhã. Lula está no paraíso. É a glória. Lula é um condenado privilegiado como nunca se viu antes na história do Brasil. Não tem do que reclamar, sinceramente.
Por Nonato Guedes