Para quem duvida que no passado, quando a Era PT se instalou no poder federal, havia relação de cordialidade entre o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu ministro da Fazenda, Antonio Palocci, o historiador Marco Antonio Villa, no livro “Década perdida”, revela detalhes do “companheirismo” predominante entre os dois líderes. Palocci descrevia Lula como um líder obstinado, dono de um carisma inconfundível e de uma sabedoria política rara”. Havia mais: Palocci admirava “a racionalidade que convive no interior de um homem que, como se sabe, é um poço de emoções”. Com o enfraquecimento de José Dirceu, Palocci passou a ocupar espaços. Da noite para o dia virou um polivalente, misto de médico, economista e literato. Mas a torrente de denúncias contra ele crescia por gravidade.
Num depoimento prestado à Polícia Federal, Rogério Buratti, ex-assessor de Palocci na prefeitura de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, revelou que o ministro da Fazenda recebera R$ 50 mil por mês como “caixinha”, entre 2001 e 2002, de uma empreiteira, a Leão e Leão, bastante influente no interior paulista. Com Palocci transformado em espécie de âncora do governo, especialmente após o início da crise do mensalão – a acusação, grave, tornou-see pesada para Palocci. De acordo com Villa, Lula fez de tudo para deslocar o eixo do debate político para questões econômicas, terreno onde a maior parte da oposição concordava com o encaminho conservador tocado por Palocci. Tanto que o ministro da Fazenda, em sabatina no Senado, foi defendido mais pelos oposicionistas do que pelos petistas. O centro do debate era o superávit primário.
Palocci também chegou a comparecer à CPI dos Bingos, que Lula chamou de “CPI do fim do mundo” e que teve como um dos expoentes o paraibano Efraim Morais, do DEM. O ministro disse não conhecer Vladimir Poletto, um dos membros da chamada República de Ribeirão Preto e que relatara estranhas negociações praticadas em uma mansão do Lago Sul em Brasília. Palocci enxergava conspiração contra o governo Lula, da qual seria a bola da vez, segundo aviso que recebera de importante liderança nacional com mandato no Congresso. Explicou que fora a Brasília chamado pelo presidente Lula. “Não foi para fazer atos de natureza duvidosa, mas para gerir uma equipe que conduzisse a economia brasileira à estabilidade”, dissertou. Quando já esperava que a tormenta estivesse esvaindo-se, Palocci foi surpreendido com uma entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo” de Francenildo Costa, caseiro da famosa mansão do Lago Sul. Ao jornal, o caseiro relatou que Palocci frequentava regularmente a casa. Outras testemunhas disseram ter visto Palocci no imóvel.
Lula, bem ao seu estilo, defendeu o ministro Antonio Palocci. “Eu devo muito de tudo que fizeos a um homem chamado Antonio Palocci. Não é economista, é médico, por isso ele ganhou respeitabilidade no mundo inteiro pela sobriedade e pela seriedade no trato das questões econômicas”. Lula ainda pediu à oposição que não atrapalhasse seu governo. “É justo fazer oposição, é democrático. Mas política tem de ser feita com sabedoria, inteligência, serenidade. Permitam que a gente conclua o nosso trabalho. Não atrapalhem. Não atrapalhem porque quem vai perder é o povo brasileiro”, argumentou o ex-presidente da República. Palocci acabou sendo substituído na Pasta por Guido Mantega. E num discurso emocionado disse que respeitara a Lei e a Constituição e jamais apoiara malfeitorias com os bens públicos”. Lula, em tom piegas, disse: “Palocci, nossa relação é de companheiros, mais do que de irmãos para a vida inteira”. Com as últimas declarações de Palocci e sua expulsão do partido, pode-se dizer que ele e o ex-presidente jamais seriam “amigos para sempre”.
Nonato Guedes