Não precisa ter trabalho para identificar quais os políticos mais encrencados na conjuntura brasileira, hoje. Atendem pelos nomes de Michel Temer (PMDB), atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ex-presidente da República por duas vezes e presumível candidato a voltar ao Planalto e Aécio Neves, o sobrinho do doutor Tancredo, ex-governador de Minas Gerais, ex-candidato a presidente da República e atualmente “senador sub-judice”. A categoria de políticos “sub-judice” é novíssima na cena brasileira. Mas, como aqui, em se plantando tudo dá, sobrou para Aécio o galardão.
Não deixa de ser curiosa a coincidência de que os três “encrencadinhos” tenham a ver com o Palácio do Planalto. A afinidade que os une, porém, é outra: estão atolados em acusações de corrupção ou algum tipo de enriquecimento ilícito, o que significa que foram bafejados pelo poder como trampolim para tirarem proveito pessoal. Os três, em bloco, formam um problemão danado para a Justiça, instituições como o Congresso e envergonham a sociedade ou o eleitorado, no qual estão incluídos aqueles que os sufragaram, sobretudo Lula e Aécio, já que Temer figurou na chapa presidencial como vice de Dilma Rousseff e foi nessa condição que se investiu quando explodiu o impeachment da ex-mandatária.
Os três ou quatro leitores deste escriba dirão que o raciocínio aqui exposto está incompleto e não faz jus à plantação de políticos envolvidos em irregularidades neste Brasilzão. É a pura verdade – e não tenho nenhum óbice ao reparo que venha a ser feito. Colhi os nomes aqui veiculados de forma aleatória, como símbolos da tragédia que o Brasil está vivendo, e porque estão na ordem do dia. Isso não significa esquecer Eduardo Cunha, Geddel Vieira (grande salteador financeiro), Antonio Palocci, José Dirceu e todo aquele listão que a gente conhece de cor e salteado, não é verdade? Ontem, ouvi o senador Lindbergh Farias, do PT do Rio de Janeiro, comentar em relação a Aécio que o senador mineiro é o pivôt da crise política que corre desenfreada pelos pagos brasileiros.
Menos, doutor Lindbergh, menos. Mas há algum sentido no seu raciocínio e isto não deve ser desconsiderado. O sobrinho do doutor Tancredo Neves vem ocupando periodicamente as atenções de três Poderes – o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Quaisquer equações que sejam feitas na cena contemporânea brasileira não pode olvidar a circunstância de que Aécio mexeu com essas três instâncias e de certa forma paralisou movimentos importantes que poderiam ter sido dados para o fechamento de capítulos pouco edificantes da nossa tragédia. Inventou-se para o político mineiro um status nunca antes experimentado na vida pública tupiniquim, o do político “sub judice”. E dá-se que também foi atribuída a Aécio uma inovação penal – o recolhimento domiciliar noturno, uma espécie de tornozeleira que o obriga a ficar em casa, o que, em se tratando de Neves, é um suplício de Tântalo, conhecendo, como os brasileiros conhecem, a sua paixão pelas noites onde todos os gatos, teoricamente, são pardos.
O Brasil tem peculiaridades que só podem acontecer aqui: no Brasil, talvez porque o nosso povo e as nossas elites tenham uma criatividade espantosa, uma capacidade invulgar de produzir factóides. Até no linguajar a gente brasileira é infinitamente mais criativa. Caixa dois, por exemplo, virou dinheiro não contabilizado; político sem mandato agora é parlamentar sub-judice, ex-presidente da República condenado é suspeito presumível, não é o acusado oficial. Vivemos transitando entre pérolas do idioma que vez por outra só os iniciados ressuscitam, como ênclises e mesóclises. É um jeito muito nosso de conversar – e despistar estrangeiros boquirrotos. Nada a reclamar. Somos inventivos, engenhosos. Fica proibido mencionar a última qualificação do enredo em relação a uma penca de saltimbancos de opereta espalhados a perder de vista. Reclamar de que? Não temos vulcões nem terremotos. Apenas temos os Temer, os Aécio, os Lula. Cada qual com seu cada qual.
Nonato Guedes