Numa matéria especial, o site da revista “Veja” faz menção ao cenário de quatro anos atrás em vigor no Brasil com o registro de que a atual conjuntura política lembra muito pouco aquela configuração. Em outubro de 2013, por exemplo, não existia a Operação Lava-Jato, o Partido dos Trabalhadores estava no poder com Dilma Rousseff, Michel Temer exercia uma vice-presidência da República decorativa, João Doria e Jair Bolsonaro eram irrelevantes e Sérgio Cabral comandava o Rio de Janeiro. Havia mais: o emprego batia recordes e o país aguardava a Copa do Mundo, em meio a protestos difusos em defesa de um certo “padrão Fifa” de serviços públicos.
A reportagem produzida pela equipe de “Veja” mostra como, em quatro anos turbulentos, tudo mudou. A Lava-Jato já fez estragos em praticamente todos os partidos políticos, incriminou cabeças coroadas do poder e ocasionou prisões de parlamentares e governantes – Sérgio Cabral é um exemplo, pelo tempo de hospedagem em cadeias e pelas descobertas de envolvimento seu em escândalos de todos os matizes possíveis e inimagináveis. Michel Temer logrou, enfim, ascender à presidência da República, depois de conspirar no Congresso para o impeachment de Dilma, afinal materializado. Como presidente, Temer não disse ainda a que veio, não teve força para levar adiante as polêmicas reformas que quis impor ao país e coleciona altíssimos índices de reprovação – certamente os mais elevados da história política brasileira recente.
Uma prova de que ninguém saiu incólume na tormenta dos escândalos envolvendo agremiações políticas está na via crúcis do senador mineiro Aécio Neves, do PSDB, ex-candidato a presidente da República. Atualmente é um parlamentar sub-judice, por ter sido afastado do exercício do mandato pelo Supremo Tribunal Federal. Tem apoio corporativo dentro do Congresso para retomar o mandato, mas sua trajetória política está invariavelmente fraturada. Aécio é nome descartado dentro do PSDB como candidato a presidente da República, a governador de Minas Gerais ou até mesmo a senador – o que indica uma biografia melancólica para o neto de Tancredo Neves, aclamado como uma das reservas morais da Nação.
Deu-se que na blitzkrieg que chacinou carreiras políticas ilustres na quadra recente da política brasileira eclodiram as nulidades que tentam se apresentar como salvadores da Pátria – casos de João Doria, eleito prefeito de São Paulo sem compromisso maior com organizações partidárias e Jair Messias Bolsonaro, um capitão reformado do Exército, extremamente bitolado no conhecimento de problemas nacionais mas que, mesmo assim, atrai adeptos de uma provável candidatura a presidente da República em 2018. Bolsonaro é a prova provada de que chegamos ao fundo do poço em termos de representatividade política, partidária e ideológica. É um desses jabutis que de tempos em tempos povoam o cenário institucional brasileiro, especialmente quando há um deserto de líderes e de ideias.
Pode ser que Bolsonaro se dissolva como o fenômeno político que aparenta ser, à medida que for desafiado a debater os graves problemas brasileiros e demonstrar que é absolutamente ignorante – e ignorante confesso, em temas prioritários como a economia. Será por aí que a máscara do capitão “bunda-suja”, como é chamado por oficiais de destaque das Forças Armadas, ruirá de vez junto com a falsa mística de que ele é solução, espécie de pomada maravilha para os males que estamos enfrentando. Bolsonaro não é, nunca foi, jamais será alternativa para um Brasil à beira do abismo. Constitui, ainda, grave ameaça à democracia, com a qual nunca teve compromissos.
Quatro anos que mudaram o Brasil. E infelizmente a pergunta que se faz é que utilidade tiveram essas mudanças, exceto o caráter pedagógico na mente dos eleitores razoavelmente informados e imunizados contra radicalismos de qualquer origem. Na prática, tivemos uma perda de tempo preciosa e abrimos espaço para que personagens estranhos ao convívio democrático como os Bolsonaro da vida se projetassem. Caberá ao Brasil decidir se está disposto a pagar um alto preço pela irresponsabilidade ou leniência no exame do comportamento dos representantes do povo. O que sinaliza ser pior – apenas para lembrar – será pior mesmo. Não creio que seja esta a grande aposta que brasileiros e brasileiras conscientes queiram fazer, após tantos solavancos.
Nonato Guedes