Alguma coisa está fora da ordem. E não é apenas na área civil. Já teve militar defendendo uma intervenção das Forças Armadas no governo brasileiro em palestra na maçonaria e seus superiores fingiram não ser no Brasil o fato. Agora, mais dois fatos colocam os militares novamente no cenário político e jurídico brasileiro. Ao mesmo tempo em que o presidente Michel Temer sanciona lei para que crimes de membros das Forças Armadas sejam julgados apenas na Justiça Militar, uma pesquisa revela que o apoio a um possível governo militar no Brasil é maior que a média global no mundo.
Pelo projeto sancionado por Temer, a Justiça Militar vira o foro para julgamento de eventuais crimes cometidos por militares contra civis, fato que atualmente acontecia na Justiça comum. Segundo o Globo, as regras que o projeto estabelece valem para o caso de homicídios dolosos (com a intenção de matar) e outros crimes dolosos contra a vida, como tentativa de homicídio. Pelo projeto, as regras valem para as seguintes situações: operações de paz e de garantia da lei e da ordem (GLO); cumprimento de tarefas estabelecidas pelo presidente da República ou pelo ministro da Defesa; ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar.
Na prática, para alguns especialistas ouvidos pelo jornal O Dia, o texto aprovado pelo Senado e sancionado por Temer, reaviva a lei da ditadura que prevê tribunal exclusivo para crimes em ações. De autoria do senador Espiridião Amim (PP/SC), o projeto recebeu questionamentos de outros parlamentares. Eu acho que é um precedente gravíssimo, alertou o senador Lindbergh Faria (PT/RJ).
Mas a generosidade como os militares não vêm apenas do Congresso Nacional e do presidente Temer. Pesquisa realizada elo Centro de Pesquisas Pew em 38 países aponta que a parcela de brasileiros que apoia ao menos uma forma de governo não democrática e que mostra simpatia por militares no poder é maior que a média em outras partes do mundo.
Conforme dados divulgados ontem pela Folha de S. Paulo, 23% dos entrevistados no Brasil diz não gostar da democracia e apoia ao menos uma das três formas de governo: tecnocrático, militar ou com um líder forte. Nos demais países pesquisados, a média é de 13%. Mas a coisa é mais grave ainda. A Folha revela que se contabilizados os brasileiros que consideram a democracia representativa “boa” mas também apoiam ao menos uma forma de governo “não democrática”, a parcela do país que considera válido um regime militar, tecnocrático ou autoritário sobe para 62%. O levantamento foi feito entre fevereiro e maio, em 38 países de cinco continentes.
Chico Buarque fez uma composição em meados dos anos 1970 que tinha o seguinte refrão: Bico calado/ Muito cuidado/ Que o homem vem aí. A música é Passaredo e Chico falava do homem que mata os passarinhos. Será que somos passarinhos prontos para cair novamente na gaiola de um regime militar?
Linaldo Guedes