Há coisas na política paraibana que guardam muita coincidência ou semelhança entre si do ponto de vista do enredo e, até, do ponto de vista do desfecho. O atual prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PSD), foi incentivado por líderes políticos do seu e de outros partidos a fazer pré-campanha informal ao governo do Estado, ainda no ano passado, Seria uma espécie de teste de densidade eleitoral, para aferir o desempenho dele nas intenções de voto em regiões distantes da Capital que governa pela segunda vez. No seu caso, talvez fosse até dispensável o tal teste, diante da perspectiva de potencial eleitoral de Cartaxo, atestada em pesquisas para consumo interno de partidos. Com o tempo passando e chegando a hora da onça beber água, Luciano sentiu que lhe faltava um item valioso a unidade das oposições que se dispuseram a apoiá-lo. Competitividade eleitoral, ficou demonstrada. O que não houve foi vontade concreta de outras legendas para adotá-lo como símbolo anti-ricardista. Confrontado com os fatos, Luciano jogou a toalha e tocou fogo no paiol político paraibano. Pelo menos na oposição, o jogo começa do zero.
Por analogia, em 2010, depois de ter exercido por duas vezes a prefeitura de João Pessoa e estando no exercício do mandato de senador, o tucano Cícero Lucena foi aconselhado por Cássio Cunha Lima a testar sua densidade eleitoral. A lógica era a mesma: Cícero tinha que provar dispor de densidade eleitoral, ou seja, de votos, para além da ponte Sanhauá. Uma nota destoante da conjuntura de agora é que o então senador Efraim Morais, do DEM, então aliado de Cássio Cunha Lima, que igualmente ambicionava a indicação ao governo do Estado, foi igualmente liberado para percorrer o Estado. Ao final dessa espécie de maratona, quem tivesse a preferência do povo seria ungido o candidato de um esquema político ao governo. Por trás desse script, a luta pela revanche contra o esquema de José Maranhão, que sambava ao redor do poder. Como foi o desfecho? Cícero e Efraim perderam tempo e sola de sapato Lucena mais do que Morais, que andou menos, porque a opção que Cássio brandiu foi a de se apoiar o nome de Ricardo Coutinho, o único em condições de bater nas urnas o esquema chefiado por Maranhão. Assim foi pensado, assim foi feito, assim se materializou.
Cícero, mais do que Efraim, embora sem passar recibo, sentiu que havia sido instrumentalizado para algum tipo de manobra política. Deu-se, por aquele período, que Cássio Cunha Lima, então defenestrado do governo pela Justiça Eleitoral, arrumou as malas e foi para um tour nos Estados Unidos a pretexto de aprimorar o inglês. De lá, soube-se depois, acionou a engrenagem para viabilizar a candidatura e a eleição de Ricardo Coutinho, o que se deu num embate contra o próprio Maranhão. Nas viradas que a política protagoniza, Cássio e Coutinho romperam, ficando o ex-senador Efraim Morais com Ricardo. Ainda levou um tempo para Cunha Lima se reaproximar de Maranhão, o que se deu na eleição municipal de 20116, apenas em João Pessoa, quando foi formada a chapa Luciano Cartaxo (à reeleição) e Manoel Júnior como vice. A correlação de forças mudara de eixo.
Na perspectiva da eleição ao governo estadual neste ano de 2018, o nome de Luciano Cartaxo despontou naturalmente, por se tratar de líder político emergente e piloto dos destinos da maior cidade da Paraíba e de uma das mais belas Capitais do Nordeste. Tiro e queda: Cartaxo para governador por uma frente de oposições a Ricardo, restando-lhe conseguir o brevêt de candidato estadualizado. E lá se foi o alcaide de João Pessoa em peregrinação pelos lugares mais longínquos da Paraíba, desbravando áreas nunca antes percorridas, para se apresentar como o Messias dos novos tempos políticos. A leveza e o trato político que compõem o perfil do prefeito de João Pessoa facilitaram adesões em torno de sua provável candidatura. O sinal de alarme, porém, começou a soar quando o prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues, ligado ao senador Cássio, resolveu pôr-se, também, como opção ao governo do Estado. Depois de muito quiproquó, Romero jogou a toalha e cogitou-se o nome da sua mulher, Micheline, para vice numa chapa encabeçada por Luciano. No Palácio da Redenção, Ricardo Coutinho assistia a tudo de camarote, inquinado com alegações de que estava sem fichas no jogo e até mesmo sem votos para conquistar uma vaga de senador.
Contrariando o Barão de Itararé, de onde menos se espera é que vem mesmo. Veio, ontem, na forma da desistência de Luciano Cartaxo em concorrer ao governo do Estado por sentir falta de apoios mais sólidos à sua pretensão. Arriscar o comando da prefeitura da Capital pelo governo do Estado, a despeito da importância deste outro quinhão, seria temerário. O tempo urgia, os prazos de desincompatibilização começaram a se afunilar, Cartaxo não obteve garantias concretas de aliança em torno do seu nome. A oposição havia se fragmentado e, fragmentada, perderia cacife para destronar o esquema do governador Ricardo Coutinho. Luciano preferiu ficar. Quanto ao teste de densidade eleitoral, tende a ser arquivado no horizonte político paraibano. Passou a ser chamado de teste derruba-candidato. Foi assim com Cícero e Efraim. Repetiu-se com Luciano, em outras siglas, outras circunstâncias. A Paraíba tem disso, sim.
Nonato Guedes