No jornalismo impresso antigo, bem melhor que o de hoje, existiam várias funções que a modernidade levou, mas não teve como substituí-las. Comecemos pela figura do copydesk. Ou copidesques, como queiram. O sistema funcionava assim: os repórteres mais novos, os chamados focas (ou não) iam para a rua, entrevistavam as pessoas, apuravam circunstâncias de um fato importante e, depois, traziam este relato para as Redações. No geral, era um texto muito mal feito, redigido às pressas, e, tanto a gramática como a técnica jornalística, iam para a casa de mãe Joana. Era um texto impublicável. Tinha, portanto, de passar pela Olivetti do redator. A este redator dava-se o nome de copydesk. Aportuguesando, copidesque.
Esses copidesques eram uma espécie de elite do jornalismo. Era do tamborilar dos seus dedos no teclado da máquina de escrever que saía a notícia com começo, meio e fim. Sim, porque naquela época havia uma técnica de se redigir notícia. Podia até mesmo ser nota de falecimento, mas a técnica era a mesma. A imprensa brasileira aprendeu com o jornalismo americano a estrutura piramidal da notícia. Pirâmide esta que podia ser invertida.
O padrão norteamericano de abertura de matérias jornalísticas, o lead, surgiu nos Estados Unidos no final do século XIX. Ao lead se seguiam A manchete histórica: Botafogo vence o Maracanã. Time da Gávea era o mesmo que foi campeão mundial em 1981 Jornal carioca Última Hora: manchetes quentes no tempo da confusão o sublead e o chamado corpo da matéria. Esse padrão estabelece que o primeiro parágrafo do texto jornalístico deve relatar, de forma sintética, os fatos mais importantes da notícia. Por isso, nele são respondidos os seis elementos básicos da informação: o quê?, quem? quando?, onde?, como? e por quê?. No Brasil, esse modelo foi introduzido em 1950. A ideia central do lead é ser um chamariz para prender a atenção do leitor, conduzindo-o aos demais parágrafos da matéria. Os manuais de redação trazem esse padrão de abertura como um modelo a ser seguido por quem busca escrever um bom texto jornalístico.
O lead, que surgiu nos Estados Unidos no final do século XIX, é fruto das dificuldades de comunicação enfrentadas pelos jornalistas enviados para cobrir a Guerra de Secessão, entre os anos de 1861 a 1865. Nasceu por um acaso durante esse conflito militar. Embora possa ser interpretado por mentes mais paranoicas como algo arquitetado para acabar com o jornalismo literário, ele não apareceu com esse propósito. Como lembra o craque Ricardo Noblat, durante a Guerra de Secessão eram muitos os repórteres e poucas linhas de telégrafo disponíveis para a transmissão das matérias. Com a precariedade do sistema, era necessário que as informações mais impostantes fossem passadas primeiro. Uma vez transmitido um único parágrafo de cada matéria, era transmitido o segundo, o terceiro e assim por diante.
Com a chegada do lead, o nariz de cera técnica de redação vigente até então foi abolido dos textos jornalísticos. Para Antônio Callado, o nariz de cera era uma introdução que criava suspense sobre o fato e fazia a essência da notícia só ser apreendida no final da leitura. O novo modelo de escrita uniformizou os textos, separando informação de opinião, tornando-os mais objetivos. A ideologia do jornalismo americano é de que o repórter de notícias deve reportar, não interpretar.
Na verdade, o próprio conceito de nariz de cera é depreciativo. Sob a perspectiva de Callado, por exemplo, o nariz de cera pode ser entendido como uma enrolação. No entanto, há uma linhagem de jornalistas que se formaram nessa tradição de literatura, como Rubem Braga, Joel Silveira e Zuenir Ventura. Esses profissionais faziam um jornalismo literário, mas nem por isso deixavam de dar a informação ao leitor. O lead é decorrente da própria evolução do jornalismo industrial e torna-se necessário quando os jornais transformam-se em empresas e a informação começa a ser vista como produto. Essa modificação é discutível porque compromete o caráter do jornalismo, que é, sim, um produto comercial, porém, de interesse público. Isso marca o início do processo da imprensa escrita como meio de informação e não mais de reflexão.
Por Agnaldo Almeida