O cenário para a eleição presidencial em outubro comportou, até agora, várias pretensões e, na prática, poucas candidaturas concretas. Figuras com espaço na mídia, como o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, o apresentador da TV Globo Luciano Huck e o prefeito de São Paulo, João Doria (que se revelou um fenômeno nas urnas em 2016) desapareceram do noticiário e já não são incluídas, sequer, em pesquisas informais ou extra-oficiais sobre intenções de voto para a corrida ao Planalto. Um outro aspecto relevante no processo é que o atual presidente, Michel Temer (MDB), investido com o impeachment de Dilma Rousseff (PT), nem tem cacife eleitoral para ser candidato à reeleição ou para transferir votos para um candidato de sua confiança chegou a ser cogitado o nome do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, sem que as articulações consigam empolgar a classe política ou o empresariado. Temer ainda tenta emplacar um nome, pelo menos a vice, numa chapa competitiva, e a dificuldade reside na obrigação de fazer a aposta certa, diante da falta de opções.
Na verdade, o quadro tornou-se atípico diante da ameaça de inelegibilidade do candidato que liderava as intenções de voto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que cumpre pena de 12 anos de prisão no prédio da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, no Paraná, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Os advogados de defesa de Lula têm impetrado sucessivos recursos para tentar fazer com que ele responda em liberdade às acusações, mas também acumulam sucessivas derrotas. A cúpula nacional do PT, presidida pela senadora Gleisi Hoffmann, optou por não avaliar Plano B ou Plano C para compensar a ausência de Lula do páreo, decidindo apostar exclusivamente no nome dele como a grande alternativa. O resultado é que o PT vem perdendo terreno, outros partidos à esquerda movem-se com desenvoltura para ocupar o espaço vazio e já chegou a ser oferecida aos petistas a vaga de vice numa chapa de oposição a Temer. As versões são desencontradas, proporcionais à desinformação do PT quanto ao futuro de Lula, em termos políticos. Lula chegou a recomendar que o PT examinasse o nome de um político nordestino para substituí-lo na corrida o que reforçou, internamente, o cacife do ex-governador da Bahia, Jaques Vágner. Fora das hostes lulopetistas, há ofertas nem sempre bem acolhidas.
O ex-ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, pré-candidato pelo PDT a presidente da República, chamou o PT para uma coligação, oferecendo a vice aos petistas como compensação. A proposta foi rechaçada de pronto pela senadora Gleisi Hoffmann, observando que com Ciro não há acordo nem com reza brava, oferecendo como explicação as críticas por ele formuladas à legenda e ao próprio Lula, bem como à ex-presidente Dilma Rousseff. Por via das dúvidas, os canais não estão totalmente fechados com Ciro Gomes. Além de Ciro, restam no páreo como pré-candidatos viáveis o senador paranaense Álvaro Dias, do Podemos, a deputada estadual Manuela DAvilla, do PCdoB do Rio Grande do Sul, o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que se afastou do cargo para concorrer, e o deputado federal Jair Bolsonaro, que continua a ser o pólo de atração de segmentos radicais, com um discurso que mistura moralismo com apelos para a volta dos militares ao poder. Bolsonaro vinha se mantendo em segundo lugar nas pesquisas, atrás de Lula, quando este era relacionado nas consultas ao eleitorado. Mas é uma incógnita tanto a manutenção de sua candidatura quanto a chance de vitória na eleição presidencial.
O Democratas pretende figurar na corrida com o nome do deputado federal Rodrigo Maia, do Rio de Janeiro, presidente da Câmara Federal. Mas o parlamentar está longe de ser bem avaliado em pesquisas de intenção de voto. Acreditava-se que uma virtual candidatura do ministro Joaquim Barbosa poderia empolgar parcelas da classe média, mas o ex-presidente do STF e relator do mensalão que incriminou petistas jogou a toalha e se declarou fora da disputa. Nos bastidores, passou a circular a versão de que Barbosa desistiu após ouvir insinuações, dentro da própria família, de que poderia vir a ter o mesmo destino do ex-ministro do Supremo, Teori Zavascki, e do ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que morreram em acidentes aéreos cujas origens ainda hoje não estão suficientemente esclarecidas para a opinião pública. A corrida se encaminha, então, para uma polarização de Geraldo Alckmin com Bolsonaro ou com Álvaro Dias. Pode parecer um cenário pífio para o exigente eleitor brasileiro, que reconquistou em 89 o direito de eleger o presidente da República e optou por Fernando Collor de Melo, que derrotou Luiz Inácio Lula da Silva em segundo turno. Collor acabou sofrendo impeachment em 1992, sendo substituído pelo vice Itamar Franco, que apoiou à sua sucessão Fernando Henrique Cardoso, o vitorioso por duas vezes. Um dado curioso é que, passado esse tempo todo do impeachment, Collor, que exerce o mandato de senador por Alagoas, ameaça novamente despontar na curva como candidato ao Palácio do Planalto. O que cria um enigma para historiadores empenhados em comprovar se a História se repete, ou não.
Nonato Guedes