Durante 21 anos, de 1964 a 1985, militares tomaram as rédeas do País pela força das baionetas, depondo o governo civil legítimo de João Goulart, cassando mandatos de líderes populares como Juscelino Kubitscheck e fechando temporariamente o Congresso Nacional para impor reformas como a do Judiciário, sem falar nas prisões arbitrárias, nas torturas nos subterrâneos dos quartéis e na censura aos intelectuais e aos órgãos de imprensa. Foi um período que se convencionou denominar de longa noite das trevas. Hoje, um oficial da reserva, o capitão Jair Bolsonaro, é candidato a presidente da República pelo voto e tem pontuado bem em pesquisas de opinião pública, sobretudo as que excluem do páreo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.
Inspirados na atitude de Bolsonaro dono de uma pregação comum a expressões da chamada linha dura pelo menos 71 militares, da ativa e da reserva, revelam-se interessados em entrar para a política no Brasil, pela porta da frente, concorrendo democraticamente nas urnas e não por meio de golpe de Estado. Uma reportagem publicada pela revista Istoé dá conta de que são constantes as reuniões e conversas entre militares que desejam ser candidatos, entre os quais há dois pontos em pauta: o combate à corrupção e o próprio direito de os membros das Forças Armadas, mesmo que na ativa, poderem disputar mandatos. A Constituição fixa a filiação partidária para a elegibilidade, mas ao mesmo tempo proíbe que militares da ativa se filiem a partidos. Uma situação esdrúxula que alguns tentam contornar lançando mão de artifícios legais. Assim, militares em atividade tentarão se apresentar à convenção de um partido como pré-candidatos, ainda que de forma independente. Se ganharem vagas de candidatos, as legendas os registram na Justiça Eleitoral e dão ciência do fato aos comandantes de unidades.
Conforme a Istoé, o mais certo seria passar antes à reserva, mas sobrevém o receio de que a candidatura não seja aceita ou que o candidato não seja eleito. Numa reunião promovida na semana passada em Brasília, na sede da Federação dos Plantadores de Cana, o general da reserva Eliéser Girão Monteiro Filho, candidato a deputado federal pelo Rio Grande do Norte, deixou no ar o sentido de suas palavras: estamos dobrando a esquina e a dobrada é para o lado direito. O general Augusto Heleno, também da reserva, discursou: não é o momento de ficar elogiando o regime militar, mas de olhar para a frente e buscar soluções. Heleno foi generoso para com o capitão, deputado e presidenciável Jair Bolsonaro: Há quem queira que ele seja uma mistura de Winston Churchill com Margareth Thatcher, Ronald Reagan e Pio XII. Seja como for, a Istoé anuncia um dado que merece reflexão: 61% dos brasileiros defendem o direito de comandantes militares falarem sobre temas relacionados à política do país. Para a revista, esse índice faz bem à democracia: mostra que a população está discernindo entre golpe militar e liberdade de opinião. A tendência seria, então, exorcizar eventuais fantasmas do passado.
Nonato Guedes