Na sessão desta terça-feira (29), a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou o julgamento da Ação Penal (AP) 996 e condenou o deputado federal Nelson Meurer (PP/PR) à pena de 13 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática dos crimes de corrução passiva e lavagem de dinheiro. Nelson Meurer Junior, filho do parlamentar, foi condenado a 4 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, por corrupção passiva. Já o réu Cristiano Augusto Meurer, também filho do parlamentar, teve extinta sua punibilidade diante do reconhecimento da prescrição.
Por maioria de votos, a Turma decidiu comunicar à Mesa da Câmara dos Deputados sobre a condenação de Nelson Meurer, assim que a decisão transitar em julgado, para que aquele órgão delibere sobre eventual perda do mandato eletivo parlamentar.
Os fatos foram objeto de investigação na Operação Lava-Jato e, de acordo com a acusação, com a ajuda de seus filhos, o parlamentar, que integrava a cúpula do Partido Progressista (PP), recebeu vantagens indevidas para dar apoio político à manutenção de Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento da Petrobras.
O julgamento teve início no dia 15 de maio, quando o ministro Edson Fachin leu o relatório e foram realizadas as sustentações do Ministério Público Federal (órgão acusador) e das defesas dos réus. Em 22 de maio, o relator e o revisor, ministro Celso de Mello, proferiram votos pela condenação dos três acusados, mas absolvendo o parlamentar das imputações de atos de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por participação em todos os 161 contratos tidos por ilícitos firmados por Paulo Roberto Costa, bem como no recebimento de R$ 4 milhões por meio do doleiro Alberto Youssef.
Doações eleitorais
O julgamento foi retomado na sessão de hoje com o voto do ministro Dias Toffoli, que acompanhou em parte o voto do relator pela condenação de Meurer, divergindo no ponto em que não considera configurados os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro quanto à doação eleitoral feita a Nelson Meurer pela empresa Queiroz Galvão, em 2010.
De acordo com o ministro, doação eleitoral oficial pode efetivamente constituir forma de recebimento de vantagem indevida ou o crime autônomo de lavagem de capitais. No caso concreto, no entanto, não ficou demonstrado que a doação eleitoral oficial recebida pelo acusado na campanha de 2010, no valor de R$ 500 mil, representou o pagamento de vantagem indevida.
Para Toffoli, tratou-se de doação materializada por transferência bancária, formalmente contabilizada na empresa doadora. Foi objeto de recibos firmados pelo então candidato, regularmente declarada na prestação de contas eleitoral e que não foi solicitada diretamente pelo acusado à Queiroz Galvão, mas sim por outros representantes do seu partido.
Caso o réu tivesse motivos para querer impedir que o seu nome fosse diretamente associado à empresa Queiroz Galvão, teria solicitado, segundo o ministro, que a doação fosse feita ao partido, a fim de que, uma vez diluída no caixa da agremiação, a ela pudesse ter acesso de forma distanciada de sua origem. Nesse contexto, a doação oficial realizada em nome do acusado, longe de militar em seu desfavor, abona a tese defensiva de que não se trataria do pagamento de vantagem indevida, e mesmo de que o parlamentar não teria ciência de sua eventual origem espúria, concluiu.
Quanto à possibilidade de tipificação autônoma dessa doação como crime de lavagem de ativos, de acordo com o ministro, não há nos autos prova suficiente de que o valor doado oficialmente pela empresa Queiroz Galvão constituísse especificamente o produto de crime contra a administração pública. Caso se tenha pretendido utilizar a doação eleitoral como forma de lavagem de capitais, não há prova segura de que o acusado Nelson Meurer tenha dolosamente concorrido para esse crime, disse. O ministro Gilmar Mendes acompanhou integralmente o voto do ministro Dias Toffoli.
Mandato parlamentar
Também o ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o entendimento de Toffoli no sentido de absolver o réu Nelson Meurer dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no que diz respeito à doação eleitoral da Queiroz Galvão ao parlamentar. No entanto, em relação às imputações do crime de corrupção passiva contra Meurer, divergiu em parte da maioria já formada, para delimitar a condenação do réu apenas ao período em que exerceu a liderança do PP, por entender que somente nesta hipótese ele teria efetiva capacidade de fornecer, direta e decisivamente, o apoio político à manutenção de Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento da Petrobras.
A corroborar tal raciocínio, veja-se que dos elementos de convicção existentes nos autos pode-se extrair que, no período em que o deputado Nelson Meurer exerceu a liderança do PP, a ele foi destinado um maior volume de dinheiro, com maior periodicidade na entrega, cessando o recebimento desse benefício ilegal exatamente no momento em que deixou aquela função, disse. Para Lewandowski, apenas no período em que Meurer esteve à frente da liderança do PP é que sua responsabilização penal pode ser caracterizada a estreme de qualquer dúvida razoável.
Com essa fundamentação, o ministro reduziu as imputações de corrupção passiva ao deputado federal a 18 vezes e de lavagem de dinheiro a sete. Com relação ao denunciado Nelson Meurer Júnior, o ministro reconheceu a prática de corrupção passiva por três vezes. Já quanto ao réu Cristiano Augusto Meurer, Lewandowski votou no sentido de sua absolvição.
Dosimetria
Na fixação da pena, considerando como marco interruptivo da prescrição o recebimento da denúncia, a Turma reconheceu que dos 30 fatos imputados como corrupção passiva a Nelson Meurer, sete estão prescritos, pois ocorreram entre 2008 e 2009, ficando assim o réu incurso neste crime por 23 vezes. Também em relação à lavagem de dinheiro, dos sete fatos imputados ao parlamentar, estão prescritos dois, consubstanciados nos depósitos fracionados em conta corrente dos valores obtidos junto ao Posto da Torre, em Brasília, que ocorreram em janeiro de 2009, totalizando, assim, cinco condenações pelo crime.
Por unanimidade, os ministros fixaram a pena final de Nelson Meurer em 13 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e o pagamento de 122 dias-multa (cada dia multa equivalendo, no caso, a três salários mínimos vigente à época do último fato).
Para Nelson Meurer Junior foi fixada a pena de 4 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 31 dias-multa (cada dia-multa equivalendo, no caso, a dois salários mínimos vigentes à época do último fato, monetariamente corrigidos).
Em relação a Cristiano Augusto Meurer, o colegiado reconheceu extinta a punibilidade por prescrição, pois a única conduta que geraria a sanção penal remonta a junho de 2008.
Efeitos da condenação
Como efeitos da condenação, os ministros fixaram aos réus o ressarcimento no valor indenizatório mínimo de R$ 5 milhões a título de reparação de danos à Petrobras e, ainda, a perda em favor da União dos bens, direitos e valores objeto da lavagem em relação aos quais foram condenados. Decretaram também, por unanimidade, a interdição de Nelson Meurer para o exercício de cargo ou função pública pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade a ele aplicada.
Foi indeferido, no entanto, o pedido da acusação de reparação de danos morais coletivos causados ao patrimônio público e social, vencidos nesse ponto o relator e o revisor.
Perda de mandato
Por maioria de votos, a Turma decidiu comunicar à Mesa da Câmara dos Deputados, por meio de ofício, sobre a condenação de Nelson Meurer, assim que a decisão transitar em julgado, para que aquele órgão delibere, como entender de direito, sobre eventual perda do mandato eletivo parlamentar, conforme prevê o artigo 55 (inciso VI, parágrafo 2º) da Constituição Federal.
Com base no total da pena aplicada no caso em análise 13 anos, 9 meses e 10 dias e o regime fechado de cumprimento inicial da pena, o relator, fazendo referência à decisão da Primeira Turma na AP 618, votou pela perda automática do mandato de Nelson Meurer. Acompanhou esse entendimento o ministro Celso de Mello.
A divergência nesse ponto foi iniciada pelo ministro Dias Toffoli. Lembrando de seu voto no julgamento da AP 470 (mensalão) e na AP 618, em que, após condenar uma parlamentar do Rio de Janeiro, a Turma seguiu seu entendimento no sentido de que fosse oficiada a Mesa da Câmara para deliberar sobre eventual perda de mandato, o ministro rejeitou a tese da perda automática. Para ele, cabe à Casa Parlamentar se manifestar sobre a questão, a teor do que dispõe a Constituição. Seguiram esse entendimento os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
Fonte: STF