Diz o jornalista Severino Ramos no seu livro O Mago de Catolé que a última grande façanha de João Agripino Filho no final do governo que empalmou na Paraíba foi eleger para o Senado dois obscuros candidatos da Arena Milton Cabral e Domício Gondim (já falecido) contra duas estrelas cintilantes do MDB (Argemiro de Figueiredo e Humberto Lucena). Na verdade, Agripino tentou operar uma composição política pela qual cada um dos partidos faria um senador (vivia-se o bipartidarismo imposto pelo regime militar de 64). Com isso, o governador planejava garantir a eleição de dois nomes de inegável nível político e intelectual, que seriam José Medeiros Vieira, pelo partido governista, e Argemiro, pela oposição.
A ideia da pacificação teria sido inspirada, de certo modo, pelo próprio Argemiro, que procurou Agripino e lhe perguntou se ele teria dificuldades em fazer um pacto com o MDB, de forma que o seu partido fizesse um senador e a Arena, outro. O governador acolheu a ideia e indagou se o candidato seria ele; Argemiro respondeu que sim. Então, João consultou o presidente Médici para saber qual a orientação do governo federal com respeito ao relacionamento com o MDB nos Estados. Médici informou que a princípio não deveria haver nenhuma aliança, mas, se fosse Argemiro, a única seria na Paraíba. Depois de ouvir, também, a Arena paraibana, Agripino comunicou a Argemiro que o acordo era viável, competindo a ele, a partir daí, desenvolver as articulações dentro do MDB, de maneira reservada. Humberto Lucena também queria ser candidato e João tinha interesse que ele não sofresse descenso na sua carreira política.
Mas, conforme narra Severino Ramos, Humberto não concordou com o pacto e passou a trabalhar o MDB para inviabilizar a composição. Em meio às démarches, o governador teve um encontro com o engenheiro Haroldo Lucena e com Samuel Duarte e mandou um recado para Humberto: Digam a ele que não faça isso; estamos dando um mandato de graça ao MDB. Se o MDB disputar vai perder e a derrota de Humberto é terrivelmente frustrante para ele e a Paraíba. Ele vai ficar quatro anos sem mandato. Humberto procurou saber que se o candidato pela Arena seria Agripino, única hipótese em que ele não disputaria. JA respondeu que não se candidataria mas iria participar da campanha e sabia que, participando, derrogaria os dois. Aconselhava Humberto a refletir muito e a disputar a deputação federal, pois seria tranquilamente eleito sem gastar um centavo. Humberto não deu ouvidos aos alertas e conduziu o partido à disputa. Argemiro ficou muito ressentido e o partido, tentando aparar arestas, prometeu que ele não gastaria nada. Argemiro disse que não tinha mais como jogar dinheiro fora, mas no decorrer do pleito foi compelido a desembolsar grande soma, acabando endividado e derrotado.
De acordo com Severino Ramos, um dos fatores que levou Agripino a cogitar o acordo na eleição para senador em 70 foi, principalmente, seu desejo de livrar-se de Domício Gondim, industrial paraibano radicado há muitos anos no Sul do país, onde possuía uma fábrica de zinco em Nova Iguaçu, Estado do Rio. Seu único vínculo com o Estado era o parentesco com Pedro Gondim, de quem era sobrinho. João achava, além do mais, que Domício não tinha credenciais ou qualificações para representar a Paraíba no Senado. Depois de gestões em várias frentes, Agripino teve um embate com Domício, que lhe disse: Não aceito ser candidato a deputado federal e não desisto de ser candidato a senador. Mas também não serei candidato a senador sem o seu apoio e sem o apoio de Pedro. Agora, espero que se o partido escolher, vocês me apoiem. Domício prometia um montão de dinheiro para financiar a campanha de todo mundo, o que deixou João de mãos atadas. Domício foi eleito com 236.080 votos, Milton com 236.462. Humberto obteve 185.332 e Argemiro, o menos votado, apesar do renome, alcançou 175.845 votos. Conclui Severino Ramos: O povo comparou João Agripino a Calígula, com uma diferença: elegeu dois (cavalos) ao Senado.
Nonato Guedes