Um quebra-cabeças atormenta postulantes a mandatos eletivos, institutos de pesquisas, cúpulas partidárias e analistas políticos em geral: a apatia do eleitorado no Brasil vai continuar quando a bola começar, de fato, a rolar? Pesquisas consecutivas sinalizam que mais de 50% dos eleitores demonstram tendência a ficar de fora do ambiente eleitoral, seja por causa do descrédito dos políticos, seja porque as opções postas na mesa não chegam a ser palatáveis. O líder das intenções de voto, por exemplo, está na cadeia (o ex-presidente Lula). E no lugar dele, quem lidera pesquisas está isolado é o caso de Jair Bolsonaro, possivelmente o mais despreparado dos candidatos, que é incapaz de atrair alianças fortes para sustentá-lo mas tem penetração em segmentos médios com sua pregação radical, extremista.
A colunista Dora Kramer escreve na Veja que o clima é de conturbação, nunca de letargia, em ano de disputa eleitoral, o que a faz acreditar que essa alegada apatia vai se dissolver no curso da campanha, com a radicalização se espalhando por todo canto. Os que hoje se dizem indiferentes dificilmente manterão distância quando as onças estiverem prestes a beber água, teoriza Kramer, acrescentando: A temperatura elevada nas redes sociais e o mau humor expresso nas pesquisas não contam uma história de apatia. Antecipam justamente o oposto: um eleitorado disposto a brigar, ainda que nem sempre dentro dos parâmetros de civilidade.
Para a colunista, nunca a política se assemelhou tanto como agora àquele lugar-comum que a compara com o movimento das nuvens. E dá como exemplo a quantidade de candidatos ou pretensos candidatos que desistiram ao longo do caminho, como o apresentador da Rede Globo Luciano Huck, o ex-ministro Joaquim Barbosa, o empresário Flávio Rocha e o atual presidente Michel Temer, detentor de um dos maiores índices de impopularidade na história de governantes do país. Daqui até o prazo final para as convenções partidárias, no dia cinco de agosto, outros poderão desistir ou ser desistidos por ação dos respectivos partidos. Henrique Meireles, na opinião de Dora Kramer, é um sério pretendente ao veto ou, no mínimo, a ser deixado de lado durante a campanha em virtude de interesses mais pragmáticos do MDB. De resto, Meireles não empolga como presidenciável, o que não deixa de ser curioso, porque ocupou o ministério da Fazenda, uma pasta estratégica e não é neófito em política. Fernando Henrique Cardoso era ministro da Fazenda e foi lançado candidato à Presidência, vencendo as eleições e logrando ser reeleito.
Há quem insista em ver semelhança entre as eleições deste ano e as de 1989, as primeiras diretas após a ditadura militar, já que tivemos a última indireta com Tancredo Neves, que não assumiu por problemas de saúde, ficando a cadeira com José Sarney. Fernando Collor, que foi vitorioso em 89 e sofreu impeachment em 92, não vê semelhança entre os dois pleitos, senão pela quantidade excessiva de candidatos. Seja como for, teremos uma eleição atípica em 2018. Daí, ser premente endossar o que Dora Kramer diz, no fecho do seu artigo: Não adiantam aflições nem previsões porque o tempo de política nesses tempos tão confusos nos leva a viver dois meses e meio como se eles fossem uma eternidade. E não tenham dúvidas: serão uma real eternidade.
Nonato Guedes