Em 82, ficou pra depois; em 86, não foi a minha vez; em 90, ninguém me sustenta. Essas palavras, em ritmo de poesia, inspiraram o líder político Ronaldo Cunha Lima a pleitear dentro do então PMDB o direito de ser o candidato oficial do partido ao governo da Paraíba. Desde 82 que Ronaldo se preparava para dirigir os destinos do Estado, mas naquele mesmo ano teve que ceder a vaga para Antônio Mariz, oriundo de uma dissidência no PDS, sucedâneo da Arena. Em 86, Cunha Lima abriu mão em favor do ex-governador Tarcísio Burity, que ingressou no PMDB na undécima hora dos prazos fatais e venceu de goleada o então senador Marcondes Gadelha (PFL) diferença de quase 300 mil votos.
Em 90, cumprindo-se a profecia de Ronaldo, ninguém o sustentou e ele partiu célere para a campanha a fim de estadualizar sua imagem além de Campina Grande, cuja prefeitura exercera. Como postulante ao Palácio da Redenção, Ronaldo empolgou o eleitorado com uma mensagem de renovação que passava pela mudança de estruturas, por um novo figurino de atuação política e pelo fim da gangorra entre Tarcísio Burity e Wilson Braga no comando do poder estadual. Um sobe e outro desce, enquanto a Paraíba padece, apregoava Ronaldo, que teve como vice o empresário Cícero Lucena, originário da construção civil. O poeta tinha 54 anos de idade por ocasião da pregação que o entronizou no poder.
Ele armou a barraca como governador em janeiro de 89,após concluir mandato de seis anos à frente da prefeitura campinense. O principal concorrente de Cunha Lima foi o ex-governador Wilson Braga (PDT), que administrara o Estado a partir de 1983. O páreo teve, ainda, a presença do deputado federal João Agripino Neto, pelo PRN, partido que o ex-governador Tarcísio Burity abraçara no Estado, no bojo da opção a nível nacional feita por Fernando Collor de Melo. João Neto obteve uma votação expressiva que catapultou a disputa para o segundo turno, travado sem a sua participação direta. Nas definições para a rodada decisiva, Agripino apoiou Ronaldo Cunha Lima, enquanto o governador Tarcísio Burity lavava as mãos, afirmando aos jornalistas quando indagado em quem votaria na segunda etapa: . Nem Braga nem Ronaldo. Voto em branco.
Um dos mais ativos articuladores da campanha de Ronaldo foi seu filho, Cássio, que anos mais tarde se tornaria governador, eleito em duas vezes a primeira em 2002 e a segunda em 2006. No discurso de posse, proferido na Assembleia Legislativa, Cunha Lima traçou uma radiografia desalentadora da Paraíba, assegurando ter recebido uma herança maldita legada pelos antecessores. À custa de muito esforço, regularizou o pagamento aos servidores públicos e fornecedores, que vinha atrasando sistematicamente. Ao mesmo tempo, empreendeu uma maratona a Brasília, junto com seu vice, Cícero Lucena, para reabrir o Paraiban, o banco estadual que havia sofrido liquidação extrajudicial do Banco Central nos estertores do segundo governo de Tarcísio Burity. Considerado um campeão de votos, Cunha Lima havia sido vereador, prefeito de Campina Grande e deputado estadual. Sua primeira vitória à prefeitura de Campina foi na década de 60 e ele governou por poucos dias, tendo sido cassado pelo regime militar instaurado em 64. Vitorioso na revanche em 82, ganhou mais dois anos de mandato graças a uma prorrogação nos municípios aprovada pelo Congresso Nacional. Como governador, Ronaldo foi protagonista de uma tragédia ao atirar contra Burity num restaurante da orla marítima de João Pessoa. Do ponto de vista administrativo, Ronaldo encetou uma gestão mediana, na opinião dos observadores, investindo, sobretudo, em infraestrutura. Ele saiu do Palácio da Redenção para ser candidato a senador, tendo sido vencedor. Depois, ocupou mandatos na Câmara Federal, tendo falecido há seis anos. A campanha de 90 que Ronaldo vivenciou foi uma das mais acirradas na história da política paraibana.
Nonato Guedes