A morte de Tancredo Neves sem ter tomado posse na presidência da República, em 1985, e a morte do tribuno Raymundo Asfora em 1987 sem ter sido empossado como vice-governador da Paraíba foram episódios de impacto que revelaram a importância dos dois cargos na história política brasileira. Tancredo foi eleito presidente em janeiro de 1985 pelo Colégio Eleitoral, de forma indireta, derrotando Paulo Maluf, e sua ascensão sinalizava o fim do ciclo militar instaurado em 1964. Mas ele foi acometido de graves problemas de saúde que provocaram seu internamento no Hospital de Base de Brasília e uma via-crúcis que comoveu o país. No dia 21 de abril, Tancredo faleceu, com o boletim médico acusando diverticulite aguda com septicemia generalizada. Foi efetivado como titular José Sarney, que assumira a presidência de forma interina no dia 15 de março numa reunião rápida no Congresso Nacional.
Sarney iniciou seu governo com o ministério indicado por Tancredo e sob o espectro de Ulysses Guimarães, presidente da Câmara Federal, que, para muitos, era quem deveria assumir a presidência na ausência de Tancredo. A candidatura de Tancredo, sob o arco da Aliança Democrática, que acolheu uma dissidência no PDS, partido de sustentação do regime, liderada por Sarney, teve respaldo na sociedade graças ao histórico de político democrata de Tancredo e ao seu compromisso com o restabelecimento das eleições diretas no mandato subsequente. Sarney lançou o Plano Cruzado, que extinguia a correção monetária, congelava preços, alugueis e a taxa de câmbio. O Plano fez sucesso junto às camadas populares e ensejou o nascimento dos fiscais de Sarney, cidadãos comuns que acompanhavam o tabelamento de preços nas lojas de varejo. Apesar disso, o Plano começou a fazer furos. O congelamento de preços aumentou o consumo, mas ocasionou o desaparecimento das mercadorias nos supermercados e a inflação começou a crescer. Sarney manteve o congelamento de preços até as eleições de 86, possibilitando que os partidos governistas (PMDB e PFL) ganhassem a maioria absoluta da Câmara e Senado, elegendo todos os governadores de Estado, à exceção de Sergipe. Com o recrudescimento da espiral inflacionária, Sarney perdeu a confiança popular e seu governo amargou pesados índices de reprovação. A lua de mel com a sociedade havia se encerrado.
Na Paraíba, no dia seis de março de 1987, faltando nove dias para a instalação do segundo governo de Tarcísio Burity, que havia sido eleito por quase 300 mil votos de maioria pelo PMDB em 86, derrotando Marcondes Gadelha, do PFL, eclodiu a notícia da morte do vice-governador eleito Raymundo Asfora, aos 57 anos, na granja Uirapuru, nos arredores de Campina Grande, onde ele residia. Laureado como um dos mais destacados tribunos da Paraíba, Asfora havia sido deputado estadual e deputado federal. Suicídio ou assassinato? A dúvida persiste ainda hoje nos meios políticos e nas esferas policiais e judiciárias da Paraíba. O corpo de Asfora estava debruçado sobre a mesa de jantar, com a cabeça apoiada no braço esquerdo, tendo à sua frente uma garrafa de uísque Teachers, pela metade, duas carteiras de cigarros, copo, água de coco, uma bíblia, lápis e papel em branco. A arma encontrada era um revólver Magnum 357. Na têmpora direita havia um orifício bem abaixo do ouvido. Um filete de sangue, coagulado, escorria até o lábio superior. Descendente de árabes, cearense de nascimento e campinense de coração, como ele se classificava, Raymundo Asfora enfrentava dívidas e problemas familiares. Em meio a controvérsias, e apesar de reconhecer a tese de homicídio, o juiz da Quarta Vara Criminal de Campina Grande, Horácio Ferreira de Melo Júnior, impronunciou os réus Gilvanete Vidal de Negreiros, ex-mulher de Asfora, apontada pela promotoria como sendo a autora intelectual da morte do marido; o caseiro da granja Uirapuru, João da Costa, e o fotógrafo Marcelo Marques, responsabilizados pela execução do crime. A investigação policial percorreu caminhos intrincados, produziu um processo volumoso mas acabou sem apontar suspeitos de forma consistente. Um caso intrigante ainda hoje. Burity governou sem vice durante todo o mandato, tornando-se refém da Assembleia Legislativa, onde deputados insatisfeitos com o não atendimento de pleitos pessoais inviabilizaram matérias do Executivo e tornaram melancólica a segunda gestão do homem que governara a Paraíba, pela primeira vez, por via indireta, a partir de março de 1979.
Nonato Guedes