O quiproquó resultante da desastrada passagem do candidato a presidente da República Jair Bolsonaro pela bancada do Jornal Nacional, da Rede Globo, faz lembrar, quatro anos atrás, o desempenho do jovem ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), na mesma bancada, desta feita com Patrícia Poeta fazendo dobradinha com William Bonner, ao contrário de ontem, em que Renata Vasconcellos operou o dueto com o editor-chefe do jornalismo da Vênus Platinada. Havia outras diferenças Eduardo era um gentleman, por mais que se discordasse de suas posições políticas. No contraponto, Bolsonaro é um despreparado, um grosseirão, que descarrega recalques pessoais valendo-se do mimetismo para atacar mulheres.
Foi o que aconteceu na refrega com Renata Vasconcellos. Pior para Bolsonaro, que recebeu publicamente lições de ética e de profissionalismo proferidas com elegante indignação por Renata. O pivôt foi uma pergunta sobre disparidade de salários entre homens e mulheres e Bolsonaro, sem ter o que dizer (aliás, não tem nada a dizer sobre absolutamente nada) partiu para a provocação lastreada no achismo, insinuando, por exemplo, que Bonner ganhava mais do que Renata por ser homem. Bolsonaro, a gente sabe, precisa provar o tempo todo que é macho, que tem aquilo roxo, como foi dito por Fernando Collor num comício em 89 na cidade de Ananindeua, interior de Alagoas.
A rebordosa veio de forma inesperada e fulminante, da parte de Renata Vasconcellos. A apresentadora questionou o sentido da ingerência de Bolsonaro, em tom de especulação, numa questão que diz respeito exclusivamente à jornalista o valor do seu salário, pago por uma empresa privada, não obstante concessionária de serviço público, que é a Rede Globo, parte mais vistosa das Organizações erigidas em forma de complexo empresarial por Roberto Marinho. No embalo da resposta a Bolsonaro, Renata lembrou, com justa razão, que ajuda a pagar o salário do deputado federal pelo Rio de Janeiro, no papel de contribuinte em dia com os impostos e indagou que projetos ou propostas importantes para a sociedade o Sr. Bolsonaro apresentou. Não havia o que responder Bolsonaro é um parasita dentro do Congresso Nacional.
Mas, voltando a Eduardo Campos: quer queiram ou não os fanáticos anti-Rede Globo, que não conseguem distinguir um jornalista assalariado de um patrão com sobrenome Marinho, ainda é uma vitrine da Globo, o Jornal Nacional, que pode dar visibilidade a candidatos e candidaturas. Tão logo encerrou sua participação na bancada do JN formada por Bonner e Poeta, Eduardo disparou telefonemas para assessores e aliados políticos, fazendo sondagens sobre sua performance na telinha, para adicionar seu próprio comentário: Minha campanha deslancha a partir de agora. Era um referência natural ao grau de audiência e alcance da Globo no território nacional.
Infelizmente, na manhã do dia seguinte à entrevista de Campos, ele morreu em acidente aéreo em São Paulo, interrompendo bruscamente uma carreira política que se prenunciava auspiciosa. Recordar esses episódios, ainda que dolorosos, é uma forma de mostrar que em 2014, bem ou mal, o eleitor brasileiro ainda tinha opções para a disputa à Presidência da República. Campos era uma promessa. Hoje, o cenário é de uma indigência de dar pena. A presença de Bolsonaros no páreo ajuda a entender as razões de ser a campanha deste ano totalmente estranha. Muito estranha mesmo!
Nonato Guedes