Os cientistas políticos David Samuels e Cesar Zucco afirmam em livro recém-publicado que a ascensão do Partido dos Trabalhadores ao poder no Brasil é o fator mais importante a moldar o comportamento político das massas no Brasil desde a redemocratização. A tese não chega a constituir nenhum achado precioso desde que ascendeu à Presidência da República com Luiz Inácio Lula da Silva o PT é tratado como fenômeno, inclusive por suas peculiaridades: não é propriamente uma agremiação que se rotula como esquerdista, mas logrou situar-se nesse espectro sociológico. Houve tentativas, pós-ditadura militar, de criar-se um Partido dos Assalariados, como chegou a ser denominado por Almino Afonso em 1978, já antevendo a necessária incorporação ao processo político brasileiro de segmentos colocados à margem ou tratados como excluídos.
Vingou o PT, porque conciliou bandeiras com o personalismo de Luiz Inácio Lula da Silva, num país em que boa parte do eleitorado não se rege por ideologias ou alegados princípios partidários, mas, sim, pelo carisma ou a antipatia que certos expoentes da cena política são capazes de produzir. Ainda vai se gastar muito papel idolatrando o PT no contexto do processo histórico mundial com a diferença de que haverá contraponto à mera apologia. Em outras palavras: o PT terá que ser tratado também, historicamente, como uma legenda que se desviou dos seus princípios enunciados no Colégio Sion em São Paulo por ocasião de sua fundação e mergulhou no submundo da falcatrua, da corrupção institucionalizada, incentivando a roubalheira e a negociata, numa negação da ética inutilmente desfraldada em comícios, em debates na televisão, em intervenções de Lula e de seus discípulos amestrados.
Dissecado o PT frente e verso, as expectativas gerais concentram-se no tamanho que a legenda vai ostentar uma vez encerradas as eleições deste ano. No afã de manter a candidatura de Lula a presidente, mesmo estando ele preso, condenado e enquadrado na lei da Ficha Limpa, a cúpula petista deixou de priorizar o crescimento ou a expansão do partido por regiões estratégicas do país. O culto à personalidade de Lula revelou-se infinitamente maior do que a tática de reestruturação do partido em bases seguras que funcionassem como vetores da força do petismo no Brasil. Seria até uma forma de homenagear o companheiro Luiz Inácio Lula da Silva, a quem se atribui o argumento de que o PT é uma ideia e ninguém mata uma ideia.
Mesmo David Samuels e Cesar Zucco, em Partisans, antipartisans, andnonpartisantis), cuja tradução livre é Partidários, antipartidários e não partidários, concluem que o lulismo representa, no final das contas, um problema para o PT. Salientam que o partido precisa demonstrar que sobrevive sem Lula para convencer o cidadão de que ainda pode mudar a vida dele para melhor. Uma segunda conclusão dos escritores é de que, ao mesmo que partidos são essenciais à democracia, o partidarismo exagerado pode prejudicá-la. Sem um sistema partidário forte, representatividade e prestação de contas sofrem. Mas o partidarismo forte traz maior polarização. E maior risco de rupturas, também, como admitem outros experts. A prova dos noves vai estar no total de integrantes de bancadas de senadores, deputados federais, estaduais, governadores laureados com o emblema amarrotado do PT. Até aqui, Lula, preso, é a prioridade. O que fazer dos que não se chamam Lula nem possuem o seu cacife pessoal e intransferível? Responderemos a essas elucubrações quando as urnas forem fechadas e reabertas para a contagem final dos números de uma disputa atípica no processo histórico brasileiro.
Nonato Guedes