No livro Batalhas Eleitorais 25 Anos de Marketing Político, o publicitário Chico Santa Rita narra a odisseia do doutor Ulysses Guimarães para tentar conquistar votos na eleição presidencial de 1989, quando concorreu pelo antigo PMDB. Um dos maiores especialistas em campanhas eleitorais, Santa Rita fez o marketing da campanha de Ulysses a pedido do seu amigo Orestes Quércia, governador de São Paulo, para quem trabalhara em outras campanhas e conta que Ulysses, durante grande parte da campanha, agiu de forma messiânica, crente de que poderia sair vitorioso, por ser identificado como expoente de lutas pela redemocratização e contra o arbítrio. No entanto, Ulysses chegou a ter menos votos que Enéias Carneiro, o folclórico candidato do Prona, cujo tempo de televisão permitia-lhe apenas dizer seu nome. O eleito naquela disputa foi Fernando Collor de Mello, em dramático segundo turno contra Luiz Inácio Lula da Silva.
Santa Rita resgata, no depoimento, trechos do último pronunciamento de Ulysses no Guia Eleitoral de 89, em que apelava aos eleitores: Não votem para a Presidência da República nos que, como cúmplices, conspiraram contra a República. Não votem nos reacionários do conservadorismo, que querem conservar a podridão da miséria, das desigualdades, da corrupção, dos privilégios. Não votem no estourado, no arrebatado, no imprevidente. A Presidência da República exige experiência, coragem e decisão. O eleitorado ignorou os alertas de doutor Ulysses Collor sofreu impeachment em 1992, acusado de chefiar o esquema de corrupção executado por Paulo César Cavalcante Farias, o PC Farias, seu ex-tesoureiro de campanha. Ulysses faleceu em desastre aéreo de circunstâncias misteriosas seu corpo nunca foi localizado. Collor é atual senador por Alagoas, filiado ao PTC e concorre ao governo daquele Estado.
Na avaliação de Chico Santa Rita, Ulysses pecou por ingenuidade e por não entender que ele era identificado com o governo Sarney, em franco desgaste, e compreendido como o político que mais mandava no país, governo e presidente incluídos. A rejeição de Sarney e Ulysses era assombrosa, beirando os 80%, índice semelhante ao da inflação mensal. O descrédito popular era absoluto. O homem que tinha enfrentado os cães da ditadura, o Senhor Diretas-Já, o artífice da Constituinte, toda a fantástica biografia do doutor Ulysses nada valia naquele momento, como moeda eleitoral, adiantou, observando que resumiu assim para Quércia, num telefonema, o cenário que imperava: O doutor Ulysses é tudo o que a população não quer. Mesmo assim, o PMDB manteve a candidatura de Ulysses, cujo Guia Eleitoral tinha a apresentação de Sílvia Poppovic, jornalista consagrada dos meios televisivos. Havia, ainda, a participação da atriz Elizabeth Savalla dando forte dose de emoção aos textos que interpretava. Nada disso comoveu o eleitorado a botar fé no velhinho, como pedia a música-jingle da campanha.
– O que a população queria era renovação detalha Chico Santa Rita, expondo os números avassaladores que as urnas trouxeram: Collor 28,52%, Lula 16,08%, Brizola -15,4%, Mário Covas 10,7%, Paulo Maluf 8,28%, Guilherme Afif Domingos 4,53% e Ulysses Guimarães 4,43%. Não obstante, o doutor Ulysses afirmava no seu pronunciamento: Vizinho das eleições, consagra-se um vitorioso: o povo brasileiro. Mobilizou-se e encheu praças e ruas com gritos,aclamações, cantos e braços erguidos. Ganhou a democracia, iluminada pela esperança, aquecida pela fé de que as coisas vão melhorar. Alguns agora nos jogam pedras. Confirma-se a dolorosa regra da precária conduta dos homens: o dia do benefício é a véspera da ingratidão. Não importa. Fizemos. Falamos de novo: a paz da família brasileira supera qualquer ressentimento. Na campanha e nesse programa, durante 60 dias, conversamos com você. Não injuriamos sua inteligência com a demagogia, não mentimos, não induzimos sermos os melhores. Quem julga é o povo, é você. Uma advertência: é tarde, mas ainda é tempo. Não votem para a Presidência da República nos que, como cúmplices, conspiraram contra a República.
Nonato Guedes