O presidente Michel Temer (MDB) esperneia com as críticas ao seu governo na campanha eleitoral, sobretudo com as advindas do candidato tucano Geraldo Alckmin, expoente, junto com ele, da denominada conspiração para a ascensão de Temer com o impeachment da petista Dilma Rousseff ocorrido em 2016. O colunista político Clóvis Rossi, da Folha de São Paulo, compara o ocaso de Temer ao ostracismo enfrentado por José Sarney em 1989, quando da eleição presidencial. Diz que Temer não aceita fazer o papel da Geni, contra quem todos atiram pedras, na letra da música de Chico Buarque de Holanda, mas pondera que a analogia e a sátira são inevitáveis diante das circunstâncias em que o emedebista toca o rumo do Palácio do Planalto numa conjuntura atípica em que o candidato favorito, Luiz Inácio Lula da Silva, está atrás das grades, acusado de corrupção, e o segundo favorito, Jair Bolsonaro, está internado em hospital após ter sido esfaqueado durante um ato de campanha esta semana em Juiz de Fora, Minas Gerais.
Sarney ascendeu à presidência da República em situação anormal, com a doença de Tancredo Neves, que havia batido Paulo Maluf em disputa indireta no Colégio Eleitoral em 1985. Tancredo não chegou, sequer, a tomar posse no dia 15 de maio de 1985. Iniciava uma via crúcis por hospitais de Brasília e São Paulo até falecer no dia 21 de abril, em clima de comoção nacional e de repercussão internacional. No discurso inaugural como presidente em exercício, José Sarney não escondeu a dimensão do seu próprio dilema ao ser confrontado com o inesperado. Estou com os olhos de ontem e ainda prisioneiro de uma emoção que não se esgota, recitou ele, na abertura da oração. Assumiu dizendo ter certeza de que em poucos dias passaria o cargo ao legítimo titular e deu posse aos ministros pedindo colaboração de todos para a travessia que seria empreendida. A solenidade, porém, acabou tendo cunho definitivo. Tancredo não ostentou a faixa presidencial, que ficou com Sarney. Nos primeiros anos de gestão, Sarney beneficiou-se de um Plano de estabilização econômica denominado Plano Cruzado, que fez a festa do PMDB nas eleições de 86, influindo na eleição da maioria dos governadores de Estados importantes. Logo o Plano fez furos, o governo caiu em desgraça e Sarney não teve um nome para chamar de seu na campanha de 89 a presidente pelo voto direto. Pelo contrário, viu-se diante de chumbo grosso de candidatos que escolheram bater no governo como estratégia para ascender nas urnas. Foi o caso de Fernando Collor de Mello, afinal eleito no segundo turno contra Lula, e que na campanha chamou Sarney de maior batedor de carteira da história da República.
No que diz respeito a Michel Temer, ele cogitou e foi estimulado no círculo íntimo a lançar-se candidato à Presidência da República este ano, o que, no seu caso, equivaleria concorrer à reeleição, já que empalma o poder desde a queda de Dilma Rousseff, de quem era vice. O desgaste persistente do governo e da figura do presidente, contudo, inibiu Temer a dar passos mais concretos. O MDB lançou como candidato o ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que também foi ministro do governo de Luiz Inácio Lula da Silva e que no Guia Eleitoral não dá uma palavra em favor de Michel Temer, enquanto o governo sangra a olhos vistos perante a opinião pública. Nem Sarney nem Temer foram eleitos presidentes, o que os assemelha quanto a um vício de origem na chegada ao poder, pelo fato de terem ascendido em situações excepcionais no caso de morte, com a morte de Tancredo, no de Temer com o impeachment de Dilma. Clóvis Rossi compara que é a solidão hoje enfrentada por Temer no poder é idêntica à solidão enfrentada por Sarney em 1985. Não há, entre os 13 candidatos a presidente em 2018, quem se arvore a defender Michel Temer, como em 1985 não houve ninguém, entre os 22 postulantes ao Planalto, quem se assumisse defensor ou aliado de Sarney, engolfado pelo retorno de uma inflação crucial para os assalariados brasileiros. É uma realidade diante da qual não há o que contestar.
Nonato Guedes, com agências