São inúmeros os petistas que sonharam com a chance de virem a ser reconhecidos como herdeiros do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O senador Lindbergh Farias, o ex-governador Jaques Wagner, a senadora Gleisi Hoffmann….Em outros tempos, o próprio José Dirceu, que disse a este repórter em João Pessoa, numa entrevista, que seria o sucessor natural de Lula como candidato a Presidente. Nunca foi menina dos olhos do ex-líder metalúrgico do ABC paulista. A própria Dilma Rousseff, turbinada por Lula depois de qualifica-la como um poste, depois convertida em Mãe do PAC, versão tupiniquim de Evita Perón dos descamisados portenhos, nunca mereceu inteiramente a confiança de Lula, que, no entanto, soube mantê-la em rédeas curtas.
Gostem ou não, Lula é um político intuitivo. Ele demonstrou que continua sendo um estrategista de mão cheia, ao insistir em esticar a corda como presumível candidato, enquanto mirava a cela em que está recolhido na Polícia Federal em Curitiba. Com isso, manteve-se em evidência, apostando na viabilidade da transferência de votos. Há um outro aspecto da estratégia lulista que deve ser levada em conta: a volta olímpica que o ex-presidente protagonizou para não deixar o PT apoiar Ciro Gomes, do PDT, em quem Lula não confia de forma alguma e do qual tem mágoas devido a críticas recebidas. Ciro vinha, maliciosamente, aproveitando-se da prisão de Lula para tentar seduzir petistas a adotá-lo. Isto chegou a ser admitido, até que Gleisi Hoffmann, reproduzindo um recado de Lula, descartou o político de Pindamonhagaba (SP) que se projetou politicamente a partir do Ceará. Ciro entendeu prontamente a sibilina advertência de Lula e cuidou de ir cozinhar-se nas próprias banhas. É o que está fazendo em face do fato consumado.
O dilema era: a quem transferir votos dentro do PT? Quem não conhece Lula deve ter ficado surpreso com a opção por Haddad, que no Nordeste, em algumas parcelas do eleitorado, é conhecido como Andrade. Mas o próprio Lula já vinha emitindo sinais de que fizera sua escolha, dando de ombros para pretensões que se acumulavam nas franjas do lulopetismo. Ele evidenciou isto, por exemplo, quando transformou Haddad em advogado seu. A intenção não era a de obter luzes jurídicas de Haddad, que não chega a ser brilhante nessa matéria, mas, sim, a de poder ter contato direto com ele, discutir propostas e repassar ordens sobre como a campanha deveria ser conduzida. Tudo aconteceu de acordo com o figurino imaginado por Lula. O que se abre, agora, é a especulação natural sobre a viabilidade da transferência de votos, e em que percentuais, diante do pouco tempo de campanha que resta.
Lá atrás, Lula havia demonstrado que Haddad é de confiança ao liberá-lo para uma aliança, inclusive, com Paulo Maluf, para as eleições à prefeitura de São Paulo. Lula não faria isto se não fosse por Haddad nenhum outro petista o persuadiria a ir se encontrar com Maluf, o eterno símbolo do Mal na política brasileira, para acertar ponteiros de apoio ou aliança. O que tem Haddad que fascina tanto Lula? As pedras conhecem alguns dos mistérios. Os mortais comuns sabem, de concreto, que Haddad é o personagem mais fácil com quem Lula pode lidar. Porque é obediente, cumpre ordens, não tem o perfil de brigador por propostas ou por cargos. O típico liderado que Lula buscava não necessariamente para substituí-lo o ex-presidente não vê substitutos à altura do seu peso, mas para carregar a bandeira do lulopetismo conforme o enredo traçado pela cabeça lúcida do presidente presidiário. Haddad ganhou a mais cobiçada disputa interna no PT: a unção como herdeiro político de Lula. Para ele, nem precisaria mais disputar a Presidência da República. Já foi muito honroso ter sido ungido dessa forma pelo companheiro-presidente.
Nonato Guedes