No seu livro Memórias Volume I, que lançou em João Pessoa na semana passada, o ex-ministro e ex-presidente nacional do PT José Dirceu comenta a eleição da paraibana Luíza Erundina para a prefeitura de São Paulo em 1992 com a observação de que a vitória foi importantíssima, mas ressalta a feroz oposição que ela enfrentou e, posteriormente, o pecado de se isolar dentro do Partido dos Trabalhadores. Textualmente, Dirceu enfatiza: Merece um destaque o governo de Luíza Erundina em São Paulo pela inusitada e única eleição de uma liderança popular de esquerda, socialista, radical, para governar a cidade. Erundina sofreu forte oposição dos meios conservadores e da mídia. Mesmo minoritária na Câmara de vereadores, seu governo viabilizou a futura eleição de Marta Suplicy e, após, a de Fernando Haddad, fazendo com que em sete administrações paulistanas, três fossem petistas.
Na avaliação de Dirceu, Erundina, que atualmente é deputada federal pelo PSB-SP, pagou com sua audácia a inversão de prioridades. Com um orçamento apertado, recebeu a cidade e, frangalhos da calamitosa administração de Jânio Quadros, tanto nas finanças como na gestão. Privilegiou, então, a periferia, investindo nos serviços de saúde, educação, habitação e assistência social para mães e seus filhos, além de trabalhar para melhorar a situação dos desempregados e dos sem-teto. Foi derrotada em duas iniciativas extraordinárias: a tarifa zero e o IPTU progressivo, anátema para as classes ricas de São Paulo e de todas as metrópoles brasileiras. A duras penas, prossegue Dirceu, Erundina manteve em dia as contas públicas durante toda a sua gestão. Teve que paralisar diversas obras viárias, abandonando algumas como a do túnel sobre a avenida Juscelino Kubitscheck.
– Acossada pela mídia reacionária, a mesma que se calou sobre a herança de Jânio Quadros, Erundina pagou caro, também, por seu apoio às greves, inclusive sendo processada e condenada por liberar as catracas dos ônibus durante uma paralisação. Nordestina (ela é natural de Uiraúna, no sertão da Paraíba), ativista da periferia, Erundina jamais foi perdoada pela ousadia de governar uma metrópole como São Paulo avalia José Dirceu. Mais adiante, o ex-ministro assinala que Luíza Erundina pecou por isolar-se com sua corrente, o PT Vivo, e por tender às decisões pessoais e de grupo. Sem sucessor, rompida com o vice Luiz Eduardo Greenhalg, viu o senador Eduardo Suplicy ser escolhido como candidato do PT sem a sua aprovação, caminho certo para a derrota, pondera Zé Dirceu.
Ele conclui que sua avaliação, quase trinta anos depois, é positiva. Erundina, nas condições de então, fez uma boa administração e Marta Suplicy faria melhor, oito anos depois, embora a imagem forjada pela mídia tenha sido outra. O que se deve ao monopólio de informação e formação que, em São Paulo, possui peso maior, seja pela presença da Folha e do Estadão, seja pelas rádios e pela então absoluta predominância da Rede Globo. Basta comparar os governos do PT com os de Paulo Maluf e Celso Pitta para que se perceba a diferença, com avaliação favorável a nós. A escolha de Suplicy como sucessor e as divisões em Santo André, Diadema e outras cidades, depois nos Estados, como Rio Grande do Sul, na hora da escolha dos candidatos, expunham outra grande questão: as prévias e seu equilíbrio em relação aos prefeitos, governadores, direções partidárias e tendências, finaliza José Dirceu.
Nonato Guedes