O economista paraibano Maílson da Nóbrega, em artigo na revista Veja, criticou a urgência que se exige na efetivação de uma reforma política no Brasil, observando que a reforma é um processo complexo e conduzido de forma lenta e incremental. Aqui, demanda-se que ela seja rápida e profunda, capaz de reduzir drasticamente o número de partidos e mudar a maneira de escolha dos parlamentares. As outras reformas, imagina-se, não seriam aprovadas por causa da má qualidade do sistema político. É por isso que se afirma que a reforma política é a mãe de todas as reformas. Esse mito, porém, esquece as reformas dos governos de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, realizadas sob o mesmo sistema político e desconsidera que o poder de aprovar a reforma política é dos interessados na própria reeleição, os quais poderão amoldar a proposta ao status quo. Políticos não se suicidam eleitoralmente, adverte Maílson, que foi ministro da Fazenda no governo José Sarney e atualmente é consultor econômico em São Paulo.
Entre as reformas de Itamar e Fernando Henrique, Maílson menciona o Plano Reale as mudanças constitucionais que permitiram privatizações em telecomunicações e energia. Foram privatizadas as estatais de mineração e da indústria, desapareceram as restrições sem sentido ao investimento estrangeiro, surgiu a Lei de Responsabilidade Fiscal, crises bancárias e cambiais foram resolvidas e legaram avanços institucionais que asseguram a solidez do sistema financeiro e a boa gestão macroeconômica. Enfim, no período Temer, acrescenta, houve a reforma trabalhista, bem como a instituição do teto de gastos. Essas reformas se beneficiaram de liderança e habilidade para compor e gerenciar maiorias estáveis, pondera Maílson.
O ex-ministro recorda que a reforma do sistema político britânico levou quase um século para ser concluída e que ela consolidou o regime de gabinete, isto é, o parlamentarismo, que inspirou muitos países. Maílson cita o livro em que Gary W. Cox descreveu o fascinante processo que, entre outras mudanças, reestruturou os distritos eleitorais, criou o serviço público profissional e universalizou o direito de voto que era restrito a homens aristocratas e proprietários de imóveis. Antes, apenas 2% dos adultos podiam votar. O avanço britânico foi impulsionado por grandes líderes e muitas vezes por pressão da opinião pública. A primeira grande reforma, de 1832, eliminou os distritos podres que elegiam dois membros do Parlamento e eram vergonhosamente negociados. Criou outros distritos, como os de Manchester, que embora já fosse uma das maiores cidades industriais do Reino Unido não elegia um único parlamentar. O direito de voto foi estendido a 17% dos homens adultos e depois assegurado a todos eles nas reformas de 1867 e 1888. As mulheres conquistaram a franquia de voto com as reformas de 1918 e 1928, após o memorável movimento que realizaram a partir do início do século XX.
Maílson da Nóbrega arremata: No Brasil, já realizamos muitas reformas políticas desde a democratização, como as que estabeleceram a cláusula de barreira e proibiram coligações em eleições proporcionais, as quais reduzirão o número de partidos nos próximos anos. Ainda há muito que fazer, mas não será preciso um século para novos avanços incrementais.
Nonato Guedes