Embora deva à imprensa brasileira a projeção do seu nome no cenário político nacional e internacional, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre cultivou uma relação belicosa com integrantes da mídia. Muitas vezes não havia razão concreta nenhuma para Lula alimentar ranços de hostilidade, mas era nos jornalistas que ele descarregava a adrenalina do poder, sobretudo quando as informações não eram do seu agrado, muito menos favoráveis à gestão. Lula criou para si mesmo o mito de que havia se tornado intocável e infalível pela circunstância de ser um ex-metalúrgico sem diploma alçado ao cargo mais importante da República, adulado por puxa-sacos no Brasil e cortejado no exterior como se fosse um produto exótico, para quem se voltavam todas as atenções.
O choque entre Lula e imprensa acabou produzindo um grave incidente diplomático quando o presidente cogitou expulsar do Brasil o jornalista Larry Rohter, correspondente do New York Times e autor de uma matéria que insinuava excesso de bebedeira por parte do mandatário brasileiro. A matéria continha depoimentos de alguns personagens respeitáveis, como Leonel Brizola, admitindo que Lula estava passando dos limites, mas o presidente já havia escolhido o bode expiatório, na figura do jornalista que veio para fazer cobertura imparcial dos fatos de nosso país. Houve um repúdio à tentativa do líder petista de radicalizar nessa questão e Lula acabou recuando a pretexto de que obteria uma reparação do jornal, que foi feita mas não da forma como ele queria.
O corpo-a-corpo com jornalistas despertou em Lula instintos primitivos de autoritarismo e personalismo foi assim que se reforçou, na sua cabeça, a ideia obsessiva de regulação da mídia, uma forma de censurar a liberdade de expressão nos meios de comunicação social. Nunca na história deste país um presidente chegara a tanto em plena vigência do regime democrático. Seis meses depois de deixar a presidência, Lula abespinhou-se com comentários de que havia diferenças entre ele e Dilma Rousseff. Não precisa ser especialista para saber que ela é diferente de mim. Eu já disse que se houver divergência será ela quem estará certa. Acontece que não há divergências. Havia e muito. Lula queixou-se em confidências a aliados seus que Dilma não tinha habilidade política para negociar com o Congresso e, por isso mesmo, estava fadada a enfrentar sérios problemas. Nesse ponto, até pareceu premonitório, dado que houve o impeachment da primeira mulher alçada à suprema magistratura da Nação.
Lula não destoou dos governantes ou dos políticos que adoram, de preferência, o aplauso, embutido na malandragem da adulação, da submissão abjeta a quem está no poder. O episódio faz lembrar uma cena ocorrida em João Pessoa quando João Agripino era governador e o tribuno popular Mocidade falava mal do seu governo. Numa solenidade em que Agripino discursou, ecoaram palmas, menos da parte de Mocidade. Perguntaram-lhe a razão de não ter feito parte do coro. Eu não sou funcionário do governo, moço, respondeu candidamente o tribuno popular. Dizia o doutor Ulysses Guimarães que os homens ficam encantados com o badalo. Apenas advertia que em certos casos era preciso haver vigilância porque, ao contrário do que supunha um governante de plantão, as zumbaias não eram para ele. O poder faz a alegria dos homens, mas também pode pô-los em depressão.
Nonato Guedes