O empresário José Alencar Gomes da Silva, que morreu no dia 29 de março de 2011 após prolongada agonia causada pelo câncer e por outros tumores, foi vice-presidente de Luiz Inácio Lula da Silva nas duas vezes consecutivas em que ele exerceu a presidência da República. Foi, por assim dizer, um vice privilegiado, que falava mal do governo e nem por isso era repreendido por Lula. O alvo de Alencar, um empresário bem sucedido que montou um império a partir da Coteminas em Minas Gerais, eram as taxas de juros que ele considerava altíssimas e insuportáveis para o mercado. Acerca do tema, Alencar pronunciou-se várias vezes, causando certo desconforto entre membros do governo, sem, contudo, produzir reações mais fortes de Lula.
A cantilena de Alencar gerou, entre auxiliares influentes dos governos petistas, a impressão de que ele era um falastrão, inconveniente, cujas declarações teriam potencial para afetar o mercado. Certa feita queixou-se de que a redução dos juros básicos, então girando em torno de 26,5% ao ano, era uma questão a ser tratada na esfera política, pois, na sua opinião, as decisões técnicas vinham dando errado. Coube a Ciro Gomes, que era ministro da Integração Nacional, sair em defesa do governo, numa entrevista em Natal, Rio Grande do Norte, onde cumpria agenda. O presidente Lula acorda e dorme pensando na redução dos juros. Se fosse um problema político, já teria sido facilmente resolvido.
A revista CartaCapital publicou matéria sobre o posicionamento de Alencar, informando que ele tinha passe livre para se manifestar em torno de questões polêmicas porque, além da amizade com o presidente Lula, tinha trânsito no setor produtivo. Ao mesmo tempo, o Palácio do Planalto dispunha de informações, segundo as quais as declarações do vice-presidente não causavam impacto negativo no mercado financeiro, não contribuíam para elevar ou baixar, por exemplo, a cotação do dólar, que é um sintoma imediato de tensões na economia. Havia quem entendesse, no Planalto, que as declarações do vice produziam um efeito colateral benéfico, por representarem uma válvula de escape do empresariado nacional.
De acordo com a revista, reinava uma dúvida sobre esse posicionamento devido ao fato de que outros interlocutores do Planalto eram chamados de radicais quando ousavam tratar do tema. Dizia-se, porém, que as declarações mais contundentes de Alencar não eram combinadas com o Palácio do Planalto. O que parecia existir era uma certa condescendência, tanto assim que ministros tidos como poderosos, como José Dirceu, aboletado na Casa Civil, evitavam polemizar, diretamente, com José Alencar. Num briefing para CartaCapital, o vice-presidente assegurava existir entre ele e o presidente absoluta tranquilidade em relação à amizade fraternal, assim como à afinidade no campo político.
Então, segue o trabalho em direção aos elevados objetivos nacionais, como foi, e é, o nosso compromisso com a Nação brasileira, frisou José Alencar, acrescentando que o Brasil estava muito bem entregue nas mãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Apenas ponderava ser contrário às taxas de juros, em doses cavalares, conforme a sua definição. Entendia que a dosagem ministrada fazia crescer a dívida pública do país como bola de neve. Mesmo quando sacrificamos os investimentos inadiáveis, destinando todo o superávit adjetivado de primário para pagamento de juros estamos cobrindo, no máximo, a metade do valor do déficit nominal totalmente construído pelos juros. Os nossos juros, ainda que fossem reduzidos, figurariam entre os maiores do planeta, enfatizou Alencar. A Coteminas estendeu tentáculos a Estados como a Paraíba, inaugurando uma filial em Campina Grande, o que tornou Alencar uma espécie de benfeitor entre os paraibanos por contribuir para gerar emprego e renda. O drama da doença que ele enfrentou comoveu toda a Nação e, em especial, o ex-presidente Lula, que sempre elogiou a correção do vice e o respaldo que ele lhe fornecia para acalmar temores do mercado financeiro.
Nonato Guedes