Em janeiro começa o governo Ricardo Coutinho-III, ainda que pilotado por João Azevedo, o ungido nas urnas em primeiro turno, em outubro, batendo lideranças políticas ancoradas num arco que ia do senador Cássio Cunha Lima ao prefeito da Capital, Luciano Cartaxo, passando por José Maranhão. A impressão de que vem aí o Ricardo III decorre do anúncio do secretariado da futura gestão, oficializado por Azevedo através de redes sociais, cujo desenho contempla quase que integralmente a equipe atual de Coutinho, com remanejamentos e alterações tão cosméticas que chegam a ser imperceptíveis para olhares mais agudos de observadores políticos.
Houve analista político que tentou em vão, ontem, encobrir a pouca autonomia de Azevedo no governo que lhe cabe empalmar, recorrendo ao surrado jargão extraído do futebol de que não se mexe em time que está ganhando. Isto é balela. Mexe-se em time a qualquer tempo, quando as condições de temperatura e pressão o exigirem. O pretexto adaptado à realidade paraibana é que o governo de João é de continuidade. Esse ponto não está em discussão. Mas a continuidade é na filosofia administrativa, no modelo que teoricamente está dando certo porque foi aprovado no voto popular com a vitória de João em primeiro turno. Talvez tenhamos, na composição de uma equipe, o primeiro caso de um governo que é a cara do antecessor. No secretariado de João constam claramente as impressões digitais de Ricardo Coutinho e ponto final porque não convém brigar com fatos.
Perguntou-se, ontem, em algumas rodas: não haveria no círculo de João Azevedo um colega de escola, de trabalho, até mesmo de pelada, que pudesse ser aproveitado por ele a título de valorizar a sua geração? Todo governante que se investe procura se cercar de remanescentes da sua geração, aquela turma que sonhou até mesmo, algum dia, chegar às franjas do poder para fazer a revolução que era traçada em mesas de bares ou até em dormentes de trilhos. João Azevedo dá a entender que não viveu fases idealistas, que não se juntou a patotas carregadas de paixões e de vocação para fazer. Ricardo surpreendeu a Paraíba com o seu Coletivo que depois foi extinto por ele mesmo, num rasgo iconoclasta de que ele foi acometido, sem que houvesse prejuízo para o êxito do projeto administrativo plantado na prancheta. O sucessor é de outra extração, de um tipo raro, abstraindo qualquer juízo de valor sobre sua competência técnica, que sempre foi incensada e exaltada independente de João ser candidato ou não a algum cargo eletivo.
Certo, a joia da Coroa não foi posta em leilão, ontem, até porque é feia a briga nos bastidores. Refiro-me à secretaria de Segurança e Defesa Social, comandada por Cláudio Lima e uma das pastas mais vulneráveis da administração Ricardo Coutinho, alvo de críticas constantes da imprensa e da sociedade em virtude da escalada alarmante de criminalidade em nosso Estado. Não faltou vontade a Cláudio Lima para reverter o quadro, muito menos faltaram instrumentos para operar. Faltou-lhe a capacidade de obrar milagres, dizem os defensores da sua permanência. Qualquer um outro que fosse escolhido por Azevedo não teria esse dom do milagre ninguém tem. A questão é outra. O governador eleito parece ter outras opções para a Segurança, no sentido de, pelo menos, testar um novo modus operandi. Mas a pressão em torno do Fica Cláudio Lima! é muito forte. Se capitular ao jogo que já extrapolou as fronteiras da Paraíba, Azevedo pode se preparar para um papel decorativo contemplando, à distância, secretários por ele renomeados despachando com Ricardo Coutinho. É o que prenuncia, se o sucessor teórico de Ricardo não assumir figurino próprio nem a mínima autonomia de voo que se cobra do piloto de uma aeronave do tamanho da Paraíba e dos seus desafios.
Nonato Guedes