Há quem diga que o governo do presidente Michel Temer, que está se finando, foi uma espécie de mal necessário tendo em vista a conjuntura anômala que se instalou no Brasil com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, acusada de pedaladas fiscais e outras irregularidades administrativas. Talvez seja mais apropriado situar a gestão Temer, que passou a vigorar de forma efetiva desde 31 de agosto de 2016, como um governo de emergência nacional, investido no vácuo do afastamento da titular reeleita e impedida para que fosse cumprido o mandamento constitucional, respeitando-se a legalidade num Brasil ainda traumatizado por golpes de exceção como o de 64, que durou 21 anos.
Paulista de Tietê, advogado, ex-presidente da Câmara Federal, filiado ao MDB, até então PMDB, Michel Temer tornou-se vice de Dilma nos dois mandatos que ela empalmou pelo voto. Foi escolhido dentro da lógica do PT, construída pelo seu líder maior Luiz Inácio Lula da Silva, de que o PMDB era o parceiro ideal para a eleição ao Planalto em face da força em plenário, no Congresso, indispensável para que a concepção petista de governar seja lá qual fosse não enfrentasse obstáculos. Acresce que Temer dispunha, também, de boa acolhida junto ao capital financeiro e federações industriais e comerciais. A ideia-motriz de Temer era a de promover um governo de salvação nacional nesse sentido, socorreu-se do apoio do PSDB e de partidos satélites, viciados no fisiologismo, para levar a cabo a missão de equilibrar as contas e atrair mais investimentos estrangeiros.
Nas condições específicas de temperatura e pressão em que foi investido, o governo Temer não teve brilho ou destaque maior. Pelo contrário, tornou-se um dos governos com maior índice de rejeição popular na história recente do país, ombreando-se em reprovação, ainda que com percentual maior, ao governo também emergencial de José Sarney, instalado no vácuo da morte de Tancredo Neves, que fora eleito por via indireta no Colégio Eleitoral em 1985 derrotando Paulo Maluf. Temer até que se esforçou para acelerar reformas mas a principal delas, a da Previdência,fica como dor de cabeça para o governo de Jair Bolsonaro. Mais do que obras, investiu na liberação de recursos e procurou fazer caixa para que o governo não caísse na bancarrota ou na insolvência. Ainda assim, o déficit público que deixa como herança é preocupante e será desafiador para a Era Bolsonaro.
Temer procurou dar continuidade a programas que haviam sido deflagrados pela ex-presidente Dilma Rousseff e equipe. Sua gestão enfrentou uma greve de caminhoneiros que trouxe enorme aflição para a sociedade brasileira e paralisou, colateralmente, outros setores produtivos. Não foi um governo perdulário, de que foi exemplo a adoção da PEC 241 aprovada no Congresso que limitou as despesas públicas, não considerando o pagamento das dívidas interna e externa por 20 anos. Foi ranzinza com a área cultural, tratando-a como subalterna, o que lhe valeu a ojeriza sistemática de artistas e intelectuais. Na prática, Temer comandou um semipresidencialismo em bases parlamentaristas, pela articulação constante que manteve com o Congresso Nacional, fazendo-o compartilhar das medidas amargas ou não que adotou. Não logrou melhorar a imagem do Brasil no exterior e teve que conviver com uma sombra incômoda a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi preso no bojo da Operação Lava-Jato. Os poucos aliados do presidente entoam a cantilena de que se ele não fez todo o Bem, evitou grandes males para o país. Seja como for, Michel Miguel Elias Temer finda o governo ganhando um retrato na parede, na galeria dos presidentes da República. Foi o máximo para sua vaidade, que, aliás, entrou para o folclore nacional.
Nonato Guedes