2018 foi um ano particularmente trágico para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Enquadrado na Lei da Ficha Limpa, foi preso em abril sob a acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, nas supostas transações com a Odebrecht envolvendo imóveis de sua propriedade na Capital e interior de São Paulo. Recolhido à cela da superintendência da Polícia Federal em Curitiba, no Paraná, o ex-presidente perdeu todos os recursos impetrados pela sua defesa com vistas a ser posto em liberdade. Numa ocasião, um juiz plantonista em final de semana chegou a deferir a soltura, mas a medida foi revogada em instância superior. Mais recentemente, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, determinou a liberdade para o ex-presidente questionando o dispositivo que prevê prisão a condenados em segunda instância. O presidente da Corte, Dias Toffoli, anulou a sentença de Marco Aurélio.
Lula era a grande aposta do Partido dos Trabalhadores para retomar o poder, que se esvaiu com o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 sob acusação de prática de pedaladas fiscais, conforme interpretação do Tribunal de Contas da União. A presidência passou a ser exercida pelo vice, Michel Temer, que não teve a colaboração dos petistas no Congresso por ser considerado traidor e golpista. Já preso, Lula insistiu em manter a ficção de que seria candidato a presidente da República. Acabou formando uma chapa apelidada de tríplex, referência ao imóvel que teria ganho da Odebrecht no Guarujá em São Paulo. Nessa chapa, Lula figurava como cabeça, tendo como vice Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo e como suplente a deputada estadual Manuela DAvila, do PCdoB do Rio Grande do Sul. Na verdade, Manuela ficou de prontidão, esperando entrar no jogo eleitoral como vice de Haddad, que substituiria Lula no páreo presidencial. Foi o que aconteceu.
A disputa tornou-se bastante acirrada o tempo todo, opondo o lulopetismo ao deputado federal Jair Messias Bolsonaro, do PSL-RJ, um outsider político, que capitalizou os votos e as preferências de eleitores conservadores e de segmentos de direita com uma pregação radicalmente moralizadora e promessa de combate implacável à corrupção. Haddad logrou ir para o segundo turno, empurrado por votações expressivas alcançadas no Nordeste, região que se tornou feudo do PT nos últimos anos. Bolsonaro, esfaqueado em plena campanha em Juiz de Fora, Minas Gerais, por um ex-militante do PSOL, Dionélyo Bispo de Oliveira, praticamente não fez campanha, valendo-se maciçamente das redes sociais para promover a comunicação com o seu público. Ele acabou destronando, nas urnas, outros candidatos como Ciro Gomes, do PDT, e Henrique Meirelles, do MDB, além do inefável Geraldo Alckmin, do PSDB, e a recorrente Marina Silva, agora sustentada pela Rede. Haddad saiu do páreo com um cesto de 45 milhões de votos, mas o grande vitorioso foi mesmo Bolsonaro.
O discurso extremado que Bolsonaro se avocou consagrou os governadores de Minas Gerais e Rio de Janeiro, Romeu Zema e Wilson Witzel. Em seu primeiro discurso depois de anunciado o resultado do pleito, em 28 de outubro, o futuro presidente mostrou-se conciliador, prometendo governar para todos. Os grandes embates, na verdade, estão reservados para o Congresso Nacional. O PT e o PSOL já anunciaram que vão boicotar as cerimônias de posse de Bolsonaro e que farão oposição cerrada ao seu governo. O presidente precisará de muito jogo de cintura política para conseguir aprovar matérias que implicam em reformas estruturais as quais não avançaram no governo de Michel Temer. Quanto a Lula, seu destino pode ser decidido no primeiro semestre de 2019. Até lá, petistas continuarão repisando na mídia e nos fóruns internacionais a narrativa do golpe contra a democracia no país. Os bolsonaristas dizem que será o jus esperneandi, ou o direito de espernear, do PT derrotado.
Nonato Guedes