A caminho de Cajazeiras, em tratativas para a fundação da Acal a Academia de Letras da terra do Padre Rolim, o escritor Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales), radicado no Recife, obsequia-me com um telefonema para comentar aspectos da conjuntura nacional nestes tempos bolsonarianos. Preocupa-lhe como a mim também a institucionalização da continência militar como símbolo do governo civil eleito em 2018. Trocando em miúdos: a formação de uma couraça de três generais em torno da cintura do presidente Jair Bolsonaro, certamente soprando insinuações sobre endurecimento do regime que está aí, com suas trapalhadas semanais e recuos a perder de vista.
Contei a Frassales que não me agrada nem um pouco essa inclinação totalitária do governo que aí está, embora não nutrisse qualquer ilusão a respeito. E dei-lhe ciência da minha posição favorável a uma frente democrática que contenha ímpetos até fascistas eventualmente disfarçados em medidas que estão sendo tomadas pelo governo de extrema-direita que ascendeu pelo voto. A minha ponderação é no sentido de que não cabe necessariamente ao PT papel de protagonismo na construção da frente democrática, tanto porque o partido não desceu do palanque nem colabora para o mínimo de tranquilidade institucional no país como porque a sua direção, nas mãos da senadora Gleisi Hoffmann, é desastrosa, o que favorece a eclosão seguida de porra-louquices políticas e ideológicas. A insistência do lulopetismo no mantra do quanto pior me causa tédio. No Brasil, quanto pior é pior mesmo, já conhecemos esse enredo.
Constato que o Partido dos Trabalhadores vive de irresignação e de contestação a tudo quanto lhe desfavoreça. Não absorveu ainda hoje o impeachment de Dilma Rousseff no bojo das pedaladas fiscais detectadas pelo TCU e que encobriam o despreparo do poste de Lula para conduzir os destinos do País. Não absorve, por extensão, a prisão do ex-presidente Lula. Insiste na cantilena da perseguição política, de maneira obsessiva. O lulopetismo apropriou-se da tese de que só há democracia se o poder estiver com o PT, ainda que o PT use o poder para cometer falcatruas, a exemplo das que foram praticadas por tantos ícones da legenda, hoje na triste condição de presidiários, inclusive o mito maior, o ex-sindicalista Lula. Essa visão maniqueísta não encontra eco em parcelas independentes da sociedade brasileira, mas faz um sucesso tremendo junto às viúvas do lulopetismo e aos órfãos do pudê.
A impressão que se tem é de que há uma ordem emanada dos presídios, mais precisamente de Curitiba, para institucionalizar a convulsão social em todas as esferas cabe, inclusive, indagar o que está realmente por trás do terror em Fortaleza, que se propaga como se por combustão espontânea já há algumas semanas. Os petistas tentam, em outra frente, recuperar o espaço que perderam o das redes sociais, onde eram senhores absolutos de supostas verdades e até de factoides como essa orquestração obsessiva para tornar Lula um Prêmio Nobel da Paz, ainda que sem grandes méritos para essa prebenda. Seja como for, o governo de Bolsonaro, que se sustenta aos trancos e barrancos, tem conserto dentro da própria democracia. Em caso de derrapagem há o remédio amargo do impeachment, que valeu para Collor, valeu para Dilma, vale para Bolsonaro. Como observa a revista Veja, até aqui a bagunça no governo Bolsonaro ainda não produziu efeitos deletérios. Isto não exime nenhum brasileiro da vigilância sobre a preservação da democracia, a conquista maior que tivemos nas últimas décadas.
Nonato Guedes