Nos anos de chumbo da Ditadura Militar, ao som do Hino Nacional, militares gostavam de bradar o slogan Brasil: ame-o ou deixe-o. O tom era de ufanismo, para esconder o que acontecia nos porões das prisões brasileiras, com inocentes sendo torturados apenas pela afronta de pensar diferente do governo de plantão à época. Assim, enquanto as torturas se intensificavam em presídios federais, Pelé fazia gols no México e canções com letras ufanistas como eu te amo meu Brasil eram estimuladas pelos militares, enquanto se vendia a tese do milagre econômico. Tudo para dizer que o Brasil era a oitava maravilha do mundo e que com os militares no poder havia justiça social, econômica e racial.
Por coincidência, no ano passado tentaram reeditar esse clima ufanista para o Brasil do futuro governo, que seria instalado este ano. Quem não se lembra que em novembro de 2018 o SBT exibiu em sua programação vinhetas com tons ufanistas, inclusive com um locutor pronunciando o celebre slogan Brasil: ame-o ou deixe-o? Esse mesmo tom foi usado pelo marketing de campanha de Jair Bolsonaro, ao mesmo tempo em que exagerava na defesa ao culto do porte e posse de arma e no preconceito nada velado com as chamadas minorias (mulheres, negros, gays e índios).
Será que exageravam mesmo? O erro de muitos eleitores (muitos não foram enganados e sabiam porque estavam votando) foi acreditar que aquilo era apenas retórica de campanha, acostumados que estavam a ver os políticos prometendo uma coisa e fazendo outra. Só que as primeiras notícias do governo confirmam todos os exageros. O filho do presidente, Flávio Bolsonaro, está sendo acusado de corrupção e cumplicidade com milícias, possivelmente envolvidas no assassinato de Marielle hoje um símbolo do Brasil atual.
As instituições jurídicas e policiais do Brasil, por enquanto, vêm fazendo ouvidos de mercador a tudo que está acontecendo. Temos que esperar para ver alguma punição à Primeira Família. Há quem não tenha essa paciência. O deputado federal Jean Willys está renunciando ao novo mandato conferido pelas urnas e vai investir na carreira acadêmica no exterior. A desesperança de Jean Willys é mais patriótica do que o ufanismo dos anos de chumbo. Não custa lembrar que ele era amigo de Marielle Franco e que no processo de votação do impeachment de Dilma Roussef, Willys foi achincalhado pelo atual presidente do Brasil. Willys é o primeiro parlamentar assumidamente gay a defender os interesses do segmento LGBT no Congresso Nacional. Por conta disso, foi alvo do deboche e de fakes-memes disparados durante a campanha de Jair Bolsonaro à presidência da República. Mesmo assim, foi eleito para o terceiro mandato consecutivo para a Câmara Federal, o que prova que nem tudo está perdido no Brasil. Mas, neste momento, temos que entender a decisão do Jean Willys. Afinal, ele deixou claro que não quer ser mártir, porque quer viver e defender seus ideais. No momento, não se sente seguro para fazer isso ficando aqui. É por amor ao país, que ele deixa o Brasil, sim!
Por Linaldo Guedes