Um episódio ocorrido em 1992- a invasão do prédio da Sudene, no Recife, por agricultores penalizados pela estiagem, marcou profundamente a biografia do senador paraibano Cássio Cunha Lima (PSDB), que está concluindo o mandato, acentuando a sua preocupação com os problemas do Nordeste, especialmente a convivência com a seca, conforme ele mesmo admite. Na época, Cássio era superintendente da autarquia, designado pelo presidente Itamar Franco, que sucedeu a Fernando Collor de Melo, alvo de processo de impeachment. Cássio foi tomado como refém, em seu gabinete, por agricultores que exigiam socorro do governo federal e negociou diretamente uma solução emergencial com o Palácio do Planalto, sendo, então, liberado pelos manifestantes.
O político paraibano viveu momentos de tensão diante da revolta dos trabalhadores com o poder público, mas teve sangue frio e habilidade para conduzir a resolução do impasse, como atestaram, naquele período, líderes políticos e autoridades federais. Cássio reconheceu que o episódio do motim no prédio da Sudene acentuou a sua preocupação com o estudo e a abordagem da questão Nordeste, que, a seu ver, continua desafiando governos centrais. Cunha Lima enfrentou, ainda, uma CPI sobre recursos do Finor, provocada pelo ex-deputado federal Avenzoar Arruda, do Partido dos Trabalhadores e saiu exibindo um atestado que não o incriminava, fornecido por órgãos públicos insuspeitos. Avenzoar insinuara que o superintendente da Sudene teria favorecido empresários com quem possuía laços familiares, mas as acusações não tiveram a gravidade que Avenzoar tentou atribuir.
Já como deputado federal constituinte em 1987, Cunha Lima externava inquietação com a falta de soluções para o Nordeste. Num discurso chegou a lembrar uma definição de cinquenta anos atrás, formulada pelo escritor e ex-ministro José Américo de Almeida, sobre o perfil da criança no Nordeste, em que dizia: Primeiro, é a ceifa da infância, a filharada que nasce mais para morrer do que para viver, a safra de anjos que o Nordeste oferece ao céu dos que, antes de aprender a comer, a comida mata ou falta. Ressaltava o parlamentar que a realidade descrita por José Américo em 1937 mudara, mas, desgraçadamente, para pior, agravada pela baixa expectativa de vida, pelo analfabetismo e pelas difíceis condições econômicas da população. Sou de uma região que resiste, sobretudo, com a fé do seu povo. Mas até quando a perfeita paciência do nordestino suportará tanto descaso?, indagou Cássio Cunha Lima no pronunciamento na Câmara.
Como governador da Paraíba foi eleito duas vezes Cássio também se empenhou na busca de alternativas para o ciclo da estiagem no Estado, atuando diretamente junto aos governos em Brasília. Ele sempre deixou claro que no Nordeste os problemas se acumulavam desde os tempos do Império e que, por isso mesmo, exigiam soluções definitivas. Lembrava que o imperador Dom Pedro prometeu vender até a última joia da Coroa para ver o Nordeste redimido, enquanto um presidente-general chorou ao presenciar o flagelo da seca. Nos anos 80, ministros, deputados e outras autoridades formaram comitiva para constatar in loco as graves consequências da seca verde, tendo sido a Paraíba escolhida para receber a delegação. Mas, de concreto, nada restara. É preciso que o poder público desperte para a solução definitiva dos variados problemas da nossa região, exortou Cunha Lima. Ele deixará o Senado convencido de que as medidas tomadas, à custa da pressão de parlamentares de diferentes Estados, ainda constituem paliativos, se comparadas com a gravidade do estado em que vive a população.
O tema da seca pautou intervenções de inúmeras lideranças políticas da Paraíba, em épocas distintas. O pai de Cássio, Ronaldo Cunha Lima, que foi senador e governador, deixou um acervo de manifestações candentes a respeito. Outros governadores, como Wilson Braga, Tarcísio Burity e Antônio Mariz, que igualmente foram parlamentares, renovaram a cantilena. E o ex-senador Cícero Lucena, que foi secretário de Políticas Regionais, com status de ministro, no governo Fernando Henrique Cardoso, deflagrou os primeiros passos para a execução do projeto de transposição das águas do rio São Francisco. Para Cássio Cunha Lima, fica para os parlamentares da nova legislatura a responsabilidade de não olvidar o Nordeste nas suas intervenções.
Nonato Guedes