Um leitor que é observador atento da conjuntura institucional paraibana chama a atenção para uma peculiaridade que ocorre na atual quadra política do Estado: quadros valorosos e valiosos para oferecer contribuição ao debate dos graves temas nacionais e locais estão sem mandato e, portanto, fora de combate ou teoricamente distantes de tribunas em que possam dar visibilidade aos seus pontos de vista e a sugestões que teriam a formular. Alguns estão de fora porque foram derrotados nas últimas eleições, outros porque não concorreram a qualquer cargo eletivo e mais outros porque penduraram as chuteiras. Três exemplos são emblemáticos dessas situações: o ex-senador Cássio Cunha Lima foi derrotado na tentativa de se reeleger para um mandato profícuo como o que vinha desempenhando; o ex-governador Ricardo Coutinho, um político talentoso, não disputou cadeiras, ficando até o último dia no exercício do poder e o ex-deputado federal Marcondes Gadelha anunciou ter pendurado definitivamente as chuteiras, passando o bastão para o filho Leonardo, que ficou numa suplência à Câmara Federal.
Uma análise desapaixonada da trajetória desses três homens públicos apontará méritos e qualificação indiscutível para valorizar a vida pública. Cássio foi deputado federal constituinte bastante jovem, prefeito de Campina Grande por três vezes, superintendente da Sudene, governador da Paraíba por duas vezes, deputado federal e senador. Ganhou visibilidade nacional ao empalmar bandeiras corajosas dentro do PSDB, ascendeu a postos influentes na hierarquia partidária e foi vice-presidente do Congresso, figurando na linha hierárquica da sucessão presidencial. A sua reeleição era tida como certa e ele largou na liderança das intenções de voto, em 2018, para o Senado, sendo atropelado no bojo de tsunami político, como costuma definir. Não está rompido com a atividade política e vale-se de tribunas improvisadas ou disponíveis quando quer comentar temas como a reforma da Previdência. Mas age cautelosamente no que diz respeito ao projeto político futuro, não deixando vazar qualquer pista sobre o que pretende fazer.
Ricardo Coutinho, adversário de Cássio Cunha Lima (de quem já tinha sido aliado) e que se obstinou em atuar nos bastidores para ajudar a derrotá-lo na campanha de 2018, era tido como pule de dez para abocanhar uma das duas vagas em disputa ao Senado Federal em outubro. Desde cedo, porém, deixou claro que não se submeteria ao pleito, optando por permanecer em Palácio até o último dia de vigência do segundo mandato. Houve uma mistura de desconfiança de Ricardo quanto a lealdades no curso da campanha, bem como receios em torno da continuidade administrativa que, segundo dizia, era seu objetivo maior, diante de avanços implementados. Entendeu que o desideratum por ele traçado só teria êxito com ele à frente do leme. Isto implicava dar celeridade a obras e projetos concebidos e, em outra frente, arregaçar as mangas para a vitória de João Azevedo. Que foi eleito no primeiro turno. Ricardo, após deixar o governo, tornou-se presidente da Fundação João Mangabeira, um Instituto de Estudos Políticos do PSB nacional. É a sua trincheira para combater o que chama de retrocessos do governo do presidente Jair Bolsonaro e, no plano local, para defender o seu governo e espicaçar os adversários que ousarem confrontá-lo.
Por último, Marcondes Gadelha é representativo de uma espécime que passou a ter prazo de validade na sociedade o político com mandato. A bem da verdade, ele andava distanciado da azáfama política por não dispor de mandato, mas não esteve inteiramente desplugado, dada a sua condição de presidente do diretório regional do PSC, credenciando-se como interlocutor natural na discussão dos problemas do Estado e do Nordeste e, também, na formulação de entendimentos para composições de âmbito eleitoral focadas especialmente na Paraíba. Ex-deputado federal desde os tempos da ditadura militar, quando atuou no grupo autêntico do MDB, combatendo o arbítrio, ex-senador, ex-candidato a governador, Gadelha estava em 2018 na condição de suplente à Câmara quando se deu a morte do deputado Rômulo Gouveia e ele foi chamado a ocupar a vaga titular em Brasília. O orador consagrado, o tribuno eloquente na defesa de causas como a da transposição das águas do rio São Francisco, já não demonstrava mais o entusiasmo de antes que contagiava plateias e multidões nos comícios de arrancada na sua cidade natal, Sousa, e na Paraíba como um todo. O grande debatedor e argumentador deixou a desejar no seu canto do cisne. Não há registro de nenhuma intervenção retórica extraordinária de sua parte. Marcondes parecia um guerreiro cansado, em busca do repouso, sem perder a lucidez que o fez compreender a inexorabilidade do processo de substituição de valores. Há inúmeros outros quadros de valor incorporados ao cenário político paraibano ou já veteranos nesse ambiente. Mas é fora de dúvida que a falta de Cássio, Ricardo e Marcondes é profundamente sentida junto ao próprio eleitor.
Nonato Guedes