Nós temos que repensar o Carnaval que estamos fazendo em João Pessoa, disse, ontem, o presidente do Folia de Rua Raimundo Nonato (Bola) ao comentar a crise do Muriçocas de Miramar, um dos maiores blocos de arrasto do país, que este ano completa 33 anos e sairá amanhã com novo formato. Além de menos trios elétricos (só dois descerão a avenida Epitácio Pessoa rumo à orla marítima), serão montados dois palcos para apresentações musicais, concentrando as atrações no bairro de Miramar, onde o bloco surgiu e se tornou patrimônio imaterial do Estado da Paraíba. A grande homenageada deste ano é a cantora Elba Ramalho mas as mudanças não deverão afetar seu show, previsto para o palco principal na Epitácio Pessoa, em frente ao posto 99.
Um dos fundadores do Muriçocas e autor do hino do bloco Flávio Eduardo Maroja (Fuba), reuniu a imprensa, ontem, em sua casa no Bessa, para explicar as razões da mudança radical no formato do bloco. Ele admitiu a falta de recursos provocada pela demonização da Lei Rouanet no governo de Jair Bolsonaro e pela dificuldade de reunir os patrocínios necessários às despesas do bloco. Mas já fazia tempo que tencionávamos realizar essas mudanças, resgatando os verdadeiros valores do nosso Carnaval. Tudo o que está acontecendo apenas antecipou o que estava fadado a ocorrer, disse Fuba. Segundo revela o colunista Abelardo Jurema, do Correio da Paraíba, um ex-dirigente da agremiação revelou que as mudanças significaram a única alternativa viável para manter o desfile. E acrescentou: A verdade é que não havia dinheiro para o desfile, os possíveis patrocinadores não confirmaram sua participação e as verbas oficiais foram drasticamente reduzidas. O custo para colocar o bloco na rua é altíssimo, superior a R$ 800 mil, entre pagamento de cachês de artistas, hospedagem, sonorização, trios elétricos, pessoal de apoio e mais uma infinidade de obrigações.
Uma das queixas correntes entre os que comandam o bloco para mudar o percurso este ano diz respeito ao comportamento de muitas empresas privadas que se utilizam do prestígio do Muriçocas para usufruir do desfile, instalando camarotes com suas marcas, vendendo ingressos, usando descaradamente os produtos do bloco e descartando qualquer hipótese de patrocínio. Fuba disse que houve uma perda do que representava o Muriçocas e que a intenção das mudanças é resgatar o folião que brinca o Carnaval tradicional. Além de Elba Ramalho, se apresentam amanhã Fuba, Ramon Schnayder, Beto Movimento, Os Gonzagas e as cantoras Renata Arruda, Val Donato e Maduaia. A Associação Folia de Rua planeja novas mudanças para o Carnaval de 2020. Um outro fator que está contribuindo para a chamada reinvenção do Carnaval pessoense foi o clima de violência registrado por ocasião do desfile do bloco Virgens de Tambaú no domingo. Raimundo Nonato é enfático: Nós temos que repensar realmente o Carnaval que estamos fazendo. O Cafuçu tem sua identidade, Muriçocas quer recuperar a sua, de bloco de bairro tradicional e tudo isso deve ser levado em conta. Já Maurício Burity, diretor-executivo da Funjope, informou que a Fundação Cultural de João Pessoa vai continuar apoiando o Folia de Rua e os blocos independentes como é o caso do Muriçocas de Miramar.
Fuba fez um apelo na condição de diretor e fundador do bloco: Faço um apelo para que as pessoas usem suas fantasias como sempre aconteceu nas Muriçocas, para que a gente realmente possa brincar o Carnaval alegre, saudável e com mais segurança. Acho que estamos dando um salto qualitativo e espero a compreensão dos foliões. Ele definiu, ainda: Eu acho que a gente deixou de ser um bloco cultural e passou a ser um movimento cultural da cidade, influenciando, inclusive, diversos outros blocos. Todos esses que compõem atualmente o Folia de Rua, praticamente todos, saíram do Muriçocas, desfilaram nas Muriçocas e fizeram com que a gente criasse uma das melhores prévias de Carnaval do Brasil.
Nonato Guedes