Justamente quando completa cinco anos de existência, a Operação Lava Jato, a mais bem-sucedida empreitada de corrupção no Brasil, enfrenta rude e melancólico golpe, com denúncias de irregularidades cometidas no seu histórico de execução, em paralelo com medidas restritivas reafirmadas pelo Supremo Tribunal Federal no tocante a crimes políticos-eleitorais, entre eles o caixa dois. Sempre se soube que ministros da Suprema Corte jamais absorveram a repercussão e os resultados positivos alcançados pela Operação que projetou o juiz Sergio Moro à condição de celebridade nacional e internacional.
Por trás da orquestração anti-Lava Jato encetada no STF sobressaía uma briga de vaidades de ministros contra juízes e procuradores. Os espaços conquistados por expoentes do Ministério Público em todo o país desencadearam ciumada de juízes togados, que sempre se identificaram como proprietários exclusivos de jurisprudências com caráter de sentença ou de lei. Essa corrente abarca nomes como o do ministro Marco Aurélio Melo e o do ministro Gilmar Mendes, este bastante polêmico pelo caráter ostensivamente parcial de inúmeras sentenças que exarou, misturando interesses pessoais com questões de âmbito público. Descobre-se, agora, que além da queda-de-braço de ministros com juízes da Lava Jato em busca de projeção na mídia e na sociedade há indícios de excessos cometidos pelos executores da similar brasileira da Operação Mãos Limpas, da Itália, que pôs a nu os escândalos de corrupção protagonizados por condestáveis da política e do poder naquele país.
Essa proposta de criação de um fundo para sustentar a Lava Jato, constituído por recursos tomados do que havia sido capturado na Petrobras em operações de proteção ou salvação do erário, fere de morte a credibilidade de expoentes mais notáveis como o atual ministro da Justiça Sergio Moro e seu substituto no comando da força-tarefa instalada a partir de Curitiba, o procurador Deltan Dalagnoll. É evidente que ainda se impõe uma checagem mais profunda ou abrangente dos indícios arguidos ou expostos, comprometendo princípios éticos que nortearam os fundamentos da Lava Jato e empolgaram a sociedade brasileira, pela perspectiva histórica ou épica de dar um basta à impunidade. Mas, em princípio, os arranhões já foram incisivos. Poderão vir a ser letais na dependência da evolução de investigações que serão deflagradas em outras frentes a partir de agora para desvendar os bastidores da mais ampla operação de combate à corrupção no País.
É lamentável que tudo isto esteja acontecendo, porque sinaliza no caminho do retrocesso no que tange ao combate sistemático à impunidade, depois de avanços substanciais que foram conseguidos, de descobertas aparentemente irrefutáveis feitas ao cabo de ações que localizaram dinheiro em espécie ou em planilhas de PowerPoint, já que a Mãos Limpas Brasileira se aprimorou mediante a utilização de recursos tecnológicos, produzindo com agilidade resultados que foram repetidamente confirmados em depoimentos prestados à Justiça, quer de forma espontânea, quer na base da delação premiada, uma outra metodologia característica da Lava Jato. Eis que as próprias delações estão em xeque, o que jogaria por terra todo o esforço empreendido e todo o apoio popular emprestado às investigações e prisões.
Ironicamente o desmonte da Lava Jato se dá em pleno governo de Jair Bolsonaro que, mediante todas as análises e avaliações feitas, seria fiador do fortalecimento da Operação até pelo interesse de manter líderes como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva atrás das grades e não na frente de urnas onde viesse a ser sufragado para um retorno triunfal ao Palácio do Planalto. Agora tudo é incerto, tudo é incógnita. No País das jabuticabas, se está prestes a voltar a valer a máxima de que pode acontecer tudo, inclusive nada. Em acontecendo tudo, na leitura subliminar dos fatos aqui esposados, poderemos ter a soltura do ex-presidente Lula mais cedo do que apregoam as campanhas orquestradas a nível nacional com a palavra de ordem Lula Livre. Em sendo solto Lula, pressupõe-se que muitos outros companheiros sejam soltos, desamarrados de tornozeleiras, liberados para andar por todo este País e promover suas farras e forrós em que se especializaram quando da passagem pelo Poder. Ah, sim! Esqueçamos essa palavrinha chata que é punição. Porque o mantra que irá vigorar é o de que todos são inocentes mesmo com prova em contrário. O Brasil não é para amadores, nunca esqueçam!
Nonato Guedes