O transcurso, hoje, dos 58 anos da chamada revolução de 1964, também apelidada de golpe ou quartelada, tornou-se um momento agitado na conjuntura política brasileira diante da insistência do presidente Jair Bolsonaro de estimular manifestações públicas e nos quartéis de celebração da data. Ontem, inúmeros partidos de oposição, como PT, PSB e PDT criticaram a atitude de Bolsonaro, repudiando o seu apoio explícito à intervenção militar e identificando, nessa postura, descompromisso de sua parte e do seu governo com o regime democrático. A revolução de 64 resultou no rodízio de generais no poder, na edição de Atos Institucionais conferindo poderes arbitrários ao presidente da República, fechamento do Congresso Nacional, prisões ilegais, torturas contra presos políticos, desaparecimentos de adversários do regime, cassações de mandatos políticos, entre um sem número de ilegalidades. O regime militar teve apoio de grupos civis quando da sua eclosão, diante da suposta ameaça de instauração do comunismo. Durou 21 anos. Teve início com a deposição do governo do presidente João Goulart, alinhado com as esquerdas, e encerrou-se com o general João Baptista Figueiredo, que concedeu anistia e revogou atos de exceção.
O presidente Jair Bolsonaro é capitão reformado do Exército e, depois de eleito sob a bandeira do conservadorismo e da ideologia de direita promoveu uma verdadeira militarização no governo, confiando ministérios a oficiais e procurando interferir em ações de pastas como a da Educação e Cultura. Ao mesmo tempo, o presidente tem investido no bate-boca pelo Twitter com militantes de partidos de esquerda, acirrando os ânimos e criando uma situação de instabilidade no país, enquanto propostas urgentes como a reforma da Previdência não tramitam com a celeridade desejada pela sociedade. O número de desempregados no país chegou a 13 milhões, conforme os dados oficiais do IBGE divulgados na semana passada. Bolsonaro, que tem como vice o general Hamilton Mourão, além de defensor explícito do regime que tomou o poder em 64 é um aliado confesso dos Estados Unidos, tendo conseguido ser recebido em audiência pelo presidente Donald Trump, a quem fez concessões que desagradaram setores da esquerda brasileira.
Conforme os registros históricos, somente em 1969, com o decreto de novos atos institucionais, a ditadura cassou o direito político de mais de 800 brasileiros. Das listas constavam deputados, professores, pesquisadores, líderes sindicais, militares, jornalistas e advogados. Pressionados politicamente, vários artistas deixam o país. Entre eles, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque e o paraibano Geraldo Vandré. Vítima de trombose, o general Costa e Silva foi afastado da presidência da República, mas a linha dura não permitiu que ascendesse ao cargo o vice Pedro Aleixo, um político da UDN de Minas Gerais. Assumiu o poder uma Junta Militar composta por três ministros, um dos quais, Aurélio de Lyra Tavares, do Exército, era paraibano. O sequestro do embaixador americano, o primeiro a ocorrer no país, serviu de pretexto para o regime decretar a pena de morte e a prisão perpétua. A doença de Costa e Silva e seu diagnóstico, trombose cerebral, foram escondidas da população graças à censura imposta aos meios de comunicação.
O primeiro presidente investido após a intervenção militar de 1964 foi o marechal Humberto de Alencar Castello Branco, que depois de deixar o cargo morreu em acidente aéreo no Ceará. Foi sucedido pelo marechal Arthur da Costa e Silva, que havia sido ministro do Exército. Com a doença deste, investiu-se a Junta Militar, substituída pelo general Emílio Garrastazu Médici. Este foi sucedido pelo general Ernesto Geisel, que havia servido na Paraíba como secretário de Fazenda, na década de 1930. Geisel deu passos concretos para o que chamava de distensão política e desativou focos de indisciplina nas próprias Forças Armadas, demitindo o ministro do Exército, Sílvio Frota, mas manteve uma linha contraditória, que implicou em alguns retrocessos. O último presidente do ciclo militar foi o general João Baptista Figueiredo, que ficou folclorizado com a expressão: prefiro o cheiro do cavalo ao cheiro do povo.
Nonato Guedes