O senador paraibano José Maranhão, do MDB, comemorou a aprovação em tempo recorde pelo Senado da Proposta de Emenda Constitucional fixando o Orçamento Impositivo. Nos termos da PEC, o governo é obrigado a executar a previsão orçamentária estabelecida pelo Congresso Nacional. As bancadas federais no Congresso sabem muito mais o que é melhor para os seus Estados do que o Executivo em Brasília, justificou Maranhão, que foi governador da Paraíba em três oportunidades e presidente da Comissão Mista de Orçamento em outra legislatura em Brasília. O seu ponto de vista é o de que a liberação de recursos vai se tornar mais ágil, o Parlamento ficará fortalecido e a população será melhor atendida.
Na verdade, a adoção do Orçamento Impositivo, que torna prioritárias as emendas consensuadas no âmbito das bancadas de diferentes partidos é um duro golpe na prática da barganha, instrumento pelo qual o Executivo tenta manter sob controle o posicionamento de parlamentares, reeditando expedientes originários do coronelismo ou do curralismo político. Isto quer dizer que a interferência do governo nas reivindicações de bancadas fica diluída ou praticamente esvaziada, enquanto, em contrapartida, o poder federal é levado compulsoriamente a tratar com atenção as demandas apresentadas nos debates em comissões e até mesmo no plenário do Parlamento. Longe de ser um instrumento democrático, a barganha equivalia à ditadura de um poder sobre o outro, estimulando o nefasto expediente do toma lá dá cá e, ao mesmo tempo, reduzindo a importância da representatividade dos parlamentares na confecção de alternativas para socorrer Estados e municípios que representam no Congresso.
Já se sabe, é claro, que o contingenciamento de 20% nos gastos e investimentos contidos na proposta orçamentária para o exercício de 2019, determinado pelo Planalto, atingirá as emendas parlamentares. Isto obriga deputados e senadores a procederem a ajustes em suas listas de indicações, como órgãos e prefeituras, via de regra destinatários desses montantes. Vá lá que o contingenciamento não seja uma represália e se imponha mesmo como consequência da grave crise econômica-financeira que atinge o coração do poder central. Não obstante, é preciso lembrar que política é a arte de produzir o consenso, o aggiornamento, e isto os parlamentares sabem fazer com competência indiscutível, cortando dali para privilegiar ou favorecer acolá. O que parece fora da ordem, como diria Caetano Veloso, é a barganha, a relação de troca, o famigerado toma lá-dá cá, que causa nojo ao eleitorado, até porque não se trata de um processo transparente, mas de um mecanismo acertado nos esconsos das conversas subterrâneas, onde a clandestinidade favorece o abuso, os acordos espúrios, como tem cansado de saber a opinião pública brasileira.
A aprovação do Orçamento Impositivo coincide com o fomento à discussão, pelo presidente Jair Bolsonaro, do que é nova e velha política na conjuntura vigente no país. De antemão sabe-se que esses conceitos costumam ser relativos e nem sempre traduzem ou espelham realidade de mudança cobrada pela sociedade e com a qual políticos estão comprometidos até por uma questão de sobrevivência. Mas é sempre salutar o debate a esse respeito. Em política não há tema-tabu ou proibido para discussão. Pode ser congelado por algum tempo, ficar em banho-Maria por conveniência ou estratégica política, mas acaba voltando à tona. Porque isto é da essência, da gênesis do jogo político-parlamentar mediatizado no confronto de propostas e na pluralidade das ideias.
O próprio Jair Bolsonaro, que foi parlamentar, apesar de não ter sido brilhante, insurgiu-se contra o fisiologismo reinante no Congresso por conhecimento de causa, porque presenciou espetáculos pouco ilustrativos ou exemplares de ações da negociação política que não condizem com os princípios republicanos, tão difundidos por gregos e troianos no panorama brasileiro. Estando hoje à frente do Executivo, Bolsonaro sente na pele o peso da barganha política, em pelo menos uma questão crucial: a reforma da Previdência. Faz de tudo para empurrar a reforma nos termos em que a concebeu, juntamente com sua equipe, mas mantém um olho no peixe, outro no gato, atento à imperiosidade de ter que ceder cargos e outras sinecuras para sensibilizar parlamentares a votarem a favor da reforma. Que tudo isso seja banido de uma vez por todas da nossa realidade, por incompatível que é com os novos tempos a que a sociedade aspira.
Nonato Guedes