A morte precoce do ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos, em acidente aéreo, no dia 13 de agosto de 2014, ainda hoje causa desalento a fatias do eleitorado e segmentos políticos que o encaravam como um líder promissor do ponto de vista da oxigenação dos quadros institucionais no país. Quando avulta no cenário a figura do presidente Jair Bolsonaro, com sua vocação para militare não para estadista, percebe-se a lacuna que Eduardo provoca. Foi abatido em pleno voo na corrida pela presidência da República, onde teria dado uma contribuição relevante ao debate nacional. Sua morte precoce não tem paralelo na história política do Brasil.
Num perfil sobre Campos, Chico de Gois e Simone Iglesias lembram que embora estivesse, segundo as pesquisas eleitorais, na terceira colocação das intenções de voto, o socialista tinha convicção em sua vitória. Quando algum aliado lamentava a falta de avanço na preferência eleitoral, Eduardo lembrava que isso não o abalava, pois, em 2006, quando disputou o Palácio do Campo das Princesas em Pernambuco pela primeira vez também começara praticamente derrotado pelos pessimistas. Sua passagem pela administração de Pernambuco de 2007 a 2014 rendeu-lhe um dos maiores índices de aprovação já vistos. Herdeiro político de Miguel Arraes, seu avô, Eduardo tinha empatia com os eleitores, gostava da proximidade com os que lhe confiavam o voto.
Era capaz de gestos generosos, como se comprovou no episódio da solidariedade irrestrita hipotecada à ex-ministra Marina Silva, quando esta não conseguiu sensibilizar a Justiça Eleitoral a registrar a agremiação alternativa que vinha buscando construir no horizonte. Eduardo atraiu Marina para sua chapa como candidata a vice-presidente, sem entrar no mérito das divergências ideológicas que certamente existiam entre eles. Tratava-se, na sua ótica, de não deixar ao relento, por causa de filigranas da Lei, um quadro de qualidade como Marina Silva, que se notabilizou por recolocar o meio ambiente na agenda de discussão dos temas relevantes, retomando o que no passado fora feito por ativistas como Fernando Gabeira, grande propagandista da defesa da ecologia. Na época da chapa Eduardo e Marina, houve polêmica sobre a prioridade que a ex-ministra deveria ter como cabeça de chapa, mas era uma discussão ociosa, já que a iniciativa de amparar Marina foi do próprio Campos. Em todo caso, ela teve a perspectiva de voltar a ocupar a cabeça de chapa em disputa presidencial. Só que perdera o bonde da História e já não tinha espaços maiores na conjuntura.
Quanto a Eduardo, como dizem os jornalistas autores do perfil, era um homem com qualidades e defeitos, como qualquer um de nós, e um político cheio de planos. Essa última parte era o que o diferenciava, aos 49 anos de idade. Dele emanava um carisma que fazia crer a parcelas expressivas do eleitorado que alguém diferente poderia vir a sentar na cadeira do Palácio do Planalto e motivar uma sociedade em estado de prostração para recuperar sua auto-estima e jogar fora o complexo de vira-lata de que falava Nelson Rodrigues. Campos teria prestado, indiscutivelmente, um valioso serviço durante a campanha do ponto de vista motivacional. Parece pouca coisa, mas era disso, urgentemente, que o Brasil estava necessitando.
Guardadas as proporções, o ex-governador de Pernambuco encarnava a simbologia que em outra época Juscelino Kubitscheck representou para a sociedade brasileira. JK transformou o ânimo do cidadão brasileiro, injetando nele uma dosagem de confiança e otimismo no seu próprio potencial para fazer do Brasil um País grande nas suas conquistas e avanços. Há ocasiões na História da Humanidade em que tudo de que se precisa é de gestos, de palavras, de símbolos. A partir daí, os resultados viriam por gravidade, como consequência natural do sentimento de motivação do povo. Eduardo Campos personificava essa possibilidade num dos ciclos em que a História do Brasil ameaçava derrapar novamente com prejuízos para os anseios de bem-estar e de progresso. O destino, infelizmente, conspirou contra ele e contra o País.
A primeira eleição de Eduardo Campos para cargo majoritário foi a disputa da prefeitura do Recife, em que ficou em quinto lugar num páreo de seis concorrentes. O vencedor foi Jarbas Vasconcelos, líder de expressão, remanescente de lutas políticas travadas contra o arbítrio. A importância de Eduardo Campos pode ser medida pelo assédio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em tê-lo próximo senão no palanque petista, pelo menos não como adversário. Os caminhos não evoluíram a ponto de promover uma convergência. De Eduardo, além da saudade, resta uma constatação: a de que não deixou herdeiros políticos com estofo para percorrer o itinerário que percorreu e que, não fosse o acidente aéreo, poderia levá-lo à plenitude com a ascensão ao Planalto. O brasileiro vive de contar perdas é uma sina desgraçada, infelizmente.
Nonato Guedes